Em nova audiência com jornalistas, CPI do Futebol mira intermediários da CBF

Guilherme Oliveira | 25/08/2015, 17h35

A CPI do Futebol voltou a ouvir jornalistas em audiência nesta terça-feira (25). Lúcio de Castro, da emissora ESPN Brasil, e Rodrigo Mattos, do portal Uol, foram os convidados. Eles incentivaram a investigação de contratos da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) por parte da comissão, mas também afirmaram que é necessário ir além desses documentos e mirar os intermediários da entidade, que asseguram os contratos.

— São nessas adjacências que se encontram as irregularidades, quase nunca nos contratos. Empresas de marketing, agências de viagem e consultorias são por onde se processam os desvios. A análise em si de um contrato entre entidade e patrocinador dificilmente irá trazer algo relevante — alertou Castro.

Mattos explicou, de forma geral, como funcionam essas relações. Segundo disse, a CBF não lida diretamente com seus patrocinadores. Empresas intermediárias captam as propostas e levam-nas para o departamento de marketing da entidade. Em troca, recebem comissões pagas em forma de aditivos aos contratos de patrocínio resultantes das negociações.

— Quanto e como a CBF paga por essa intermediação, não sabemos. Pedimos a eles se poderiam abrir esses dados e disseram que não abririam. O balanço da CBF tem transparência muito pequena. Seria muito interessante abrir essa caixa-preta e obter os contratos de comissões — disse.

Castro deu um exemplo de como esses contratos ocultos afetam a esfera pública. Em 2008, a Seleção Brasileira jogou um amistoso na cidade-satélite do Gama (DF) para marcar a reinauguração do Estádio Valmir Campelo Bezerra (o Bezerrão) após obras de modernização. O governo do Distrito Federal investiu mais de R$ 8 milhões no evento. Parte dessa verba, junto com os direitos de organização da partida, foi repassada, através de vários intermediários, a uma empresa que tinha como sócio o então presidente da CBF, Ricardo Teixeira.

Gestão atual

Ricardo Teixeira presidiu a CBF até 2012 e foi substituído por José Maria Marin. Em 2015, Marco Polo Del Nero assumiu o comando da entidade. Rodrigo Mattos observou que, dentro do que é possível apurar, as gestões de Marin e Del Nero elevaram o valor pago em comissões a intermediários. Atualmente, eles giram entre 15% e 20% do valor dos contratos, segundo o jornalista.

Além disso, Mattos apontou que os demonstrativos de despesa da CBF no ano de 2014, quando já havia transição entre os presidentes, indicam R$ 80 milhões destinados a “serviços de terceiros”. Ele manifestou estranhamento com a rubrica.

— Clubes têm contratos assim porque pagam jogadores em direitos de imagem, mas a CBF não paga nenhum jogador. Quem recebe esse dinheiro? Para onde ele vai? Que despesas são essas? — indagou.

Lúcio de Castro relatou o caso dos filhos de Marco Polo Del Nero. Um deles, Marco Polo Del Nero Filho, abriu uma empresa nos Estados Unidos em outubro de 2014 sem declará-la à Receita Federal e com um braço nas Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal. Na mesma época, lembrou Castro, José Maria Marin esteve nos Estados Unidos e acertou pagamento de propina pela negociação dos direitos de transmissão da Copa do Brasil e da Copa América — informação já confirmada por investigações do FBI, que levaram Marin à prisão na Suíça. A empresa de Del Nero Filho tem como endereço o escritório de advocacia do pai.

Já Marcus Vinicius Del Nero, segundo o jornalista, é diretor de Arte da Mowa Sports, uma empresa de conteúdos multimídia contratada pela CBF para tocar a CBF TV. A empresa ganhou um estúdio próprio na sede da entidade, no Rio de Janeiro.

— A participação dos filhos nos negócios faz parte do modus operandi de Del Nero. Esta CPI pode ir parar bem longe. É preciso identificar os vasos intercomunicantes de cada um dos personagens em questão, como os cirurgiões quando se deparam com uma área contaminada e investigam todo o entorno do tecido ruim, a capilaridade por onde esses vasos se alimentam e são alimentados — afirmou o jornalista.

Próximos passos

O relator da CPI, senador Romero Jucá (PMDB-RR), recebeu dos jornalistas a íntegra dos documentos apresentados para embasar as exposições. Ele disse que irá cruzar as novas informações com aquelas já obtidas pela CPI para, só então, tomar novas providências, como requerer medidas legais ou convocar depoentes.

O senador Romário (PSB-RJ), presidente da comissão, reafirmou estar confiante no andamento das investigações e agradeceu a contribuição dos convidados. Romário também anunciou que a CPI ouvirá na próxima quinta-feira (27), às 10h15, os jornalistas Amaury Ribeiro Jr., Leandro Cipoloni e Luiz Carlos Azenha, coautores do livro O Lado Sujo do Futebol, que trata da corrupção no esporte.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)