Revisão da Lei de Anistia é defendida em debate na Subcomissão da Memória

Iara Guimarães Altafin | 26/08/2013, 16h15

Convidados e senadores que participaram de audiência pública na Subcomissão da Memória, Verdade e Justiça do Senado, nesta segunda-feira (26), defenderam a revisão da Lei de Anistia (Lei 6.683-79). Os participantes, que discutiram abusos cometidos por agentes do Estado durante a ditadura militar, rejeitam a tese de que a anistia alcance autores de crimes como os de tortura, assassinatos e ocultação de cadáveres.

– A Lei de Anistia não pode servir para tornar o Brasil uma nação sem memória, sem registro. Não é um atestado de amnésia coletiva, não pode servir de escudo para a impunidade ­ – afirmou Aurélio Rios, procurador federal dos Direitos do Cidadão.

No mesmo sentido, Cláudio Fonteles, ex-coordenador da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e ex-procurador-geral da República, disse que não se pretende fazer nada contra o Exercito, a Marinha ou a Aeronáutica, mas apelou às atuais lideranças militares para que não prestem solidariedade a “agentes públicos que denegriram essas instituições”.

A revisão da Lei de Anistia esbarra em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de 2010, que rejeitou pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de mudança no texto para permitir a investigação de crimes praticados pelos agentes da repressão.

Agora a OAB pede ao Supremo que julgue os embargos declaratórios apresentados após a decisão de 2010, um recurso com objetivo de esclarecer omissões e contradições na posição então assumida pelos ministros, que permita nova interpretação da decisão anterior.

Justiça

Um dos aspectos apontados no debate nesta segunda-feira foi o papel transitório da Lei de Anistia, criada no contexto entre o fim da ditadura militar e a retomada da democracia, sendo “o acordo político possível” à época. Na situação atual, os debatedores pedem que a Comissão Nacional da Verdade (CNV), criada em 2011 no âmbito da Casa Civil da Presidência da República, esclareça os fatos ocorridos durante o regime militar, mas também promova a Justiça.

Para Claudio Fonteles, a comissão tem por missão apresentar à sociedade “o que significou o estado ditatorial militar”, mas também esclarecer o paradeiro de pessoas que foram mortas pela repressão política naquele período.

Ele falou sobre relatório em que trabalhou, destacando um documento oficial encontrado no Arquivo Nacional, com registro de 50 mortes de presos entre 1970 e 1975 no Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), em São Paulo.

Para Gilney Viana, coordenador do Projeto Direito à Memória e Verdade, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a Lei de Anistia deu perdão a torturadores, mas deixou de fora muitas das vítimas da repressão. Ele sugere que a CNV tenha o poder de ampliar os critérios relativos ao enquadramento de vítimas, para efeito dos benefícios pela Lei da Anistia, que prevê indenizações aos perseguidos ou às suas famílias.

Ele citou, como exemplo, líderes e militantes camponeses que foram assassinados por fazendeiros, que agiam com a cobertura de agentes da repressão.

– Isso é uma incoerência que a comissão pode ajudar a resolver – apelou.

Já Maria Eliana de Castro Pinheiro, irmã de um dos desaparecidos da Guerrilha do Araguaia, cobrou esclarecimentos sobre os corpos dos desaparecidos políticos. Conforme explicou, a família deseja cumprir o rito de enterro e ter um “túmulo onde chorar”. Ela também pediu a revisão da lei para que possa haver justiça, com a indicação dos culpados pelas mortes dos militantes políticos.

– Ali não foi uma guerra, pois até na guerra dá-se o direito à retirada dos mortos, e eles não nos deram esse direito. Foi um genocídio, uma execução sumária de jovens – acusou.

Na opinião de Fábio Borges da Silva, pesquisador da Comissão Anísio Teixeira de Memória e Verdade da Universidade de Brasília (UnB), a verdade sobre aquela época só será divulgada se houver pressão da sociedade e mobilização popular.

Comissão Nacional da Verdade

No debate, o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) disse que acompanha com “apreensão” as notícias a respeito de possível crise interna na CNV, resultado de divergências quanto à condução dos trabalhos. Destacando a importância da comissão, ele disse que o país precisa conhecer a história dos “tempos de chumbo”, o papel desempenhado pelos que deram suas vidas para que as gerações atuais possam se manifestar com liberdade e também daqueles que cometeram crimes, como de tortura, para os quais disse não caber anistia.

– Por isso, a Comissão da Verdade tem que dar certo, tem que ter um relatório contundente e tem que dar o próximo passo, a revisão da Lei da Anistia, a lei possível à época, mas que foi também a lei imposta pelo regime – pediu.

Já o senador Pedro Simon (PMDB-RS) cobrou da presidente da República, Dilma Rousseff, a indicação de nomes para substituir Cláudio Fonteles, que deixou a comissão em julho, e o ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça, que se afastou em maio, por motivo de doença.

Também o presidente da Subcomissão da Memória, Verdade e Justiça, senador João Capiberipe (PSB-AP), ressaltou a relevância do trabalho da CNV e importância do “acerto com o passado”, não apenas para os que viveram durante a ditadura militar, mas também “para os que nasceram e cresceram na democracia”. A subcomissão é vinculada à Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH).

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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