Discussão sobre pacto federativo não é técnica, e sim política, diz historiadora

Ricardo Koiti Koshimizu | 18/10/2012, 18h20

Ao analisar a forma como se dá o debate sobre o sistema federativo do país, a historiadora Miriam Dolhnikoff observou que hoje a discussão é feita em termos eminentemente técnicos – envolvendo, por exemplo, questões como a divisão do bolo tributário entre União, estados e municípios. Mas ela ressaltou que, na verdade, o assunto “não é técnico, e sim político”.

– Acho estranho que se faça uma discussão tão técnica – criticou a historiadora.

Professora da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), Miriam fez essas declarações logo após a abertura do seminário Desafios do Federalismo Brasileiro, nesta quinta-feira (18).

Miriam citou como exemplo a divisão da arrecadação tributária. De acordo com ela, o foco em argumentações técnicas “como se fossem questões matemáticas” impede o debate de o que se faz posteriormente com a arrecadação, quem são os responsáveis pelas decisões que envolvem esses tributos, quais são os compromissos das elites que governam os estados e quais são os compromissos das elites que dirigem o país, entre outros pontos.

– Parece-me que despolitizar o assunto torna mais fácil discutir mudanças no pacto federativo sem ter de enfrentar questões espinhosas – avaliou.

Pacto político

Na abertura do seminário, a historiadora lembrou que uma de suas teses é a de que o sistema federativo brasileiro não surgiu com a república, mas sim antes, já na monarquia – e com um objetivo político: a consolidação do Estado brasileiro.

Segundo Miriam, o sistema federativo (embora não tivesse oficialmente esse nome) foi implantado no país durante a monarquia como “uma estratégia de construção do Estado no Brasil”, unificando regiões que possuíam entre si poucas ligações – ou simplesmente nenhuma. Ela também argumentou que desde aquela época o sistema federativo do país já se caracterizava pela tensão entre interesses regionais e nacionais.

– Quando houve a independência, não havia uma unidade na América portuguesa. Essa unidade só se tornou possível porque prevaleceu um pacto federativo – argumentou ela, contrastando o caso brasileiro com a fragmentação que ocorreu na América espanhola.

A historiadora esclareceu que o sistema federativo, naquela época, foi a condição imposta pelas elites regionais brasileiras para aceitar a unidade sob um único Estado. E que a resistência desses governos locais frente à tentativa de Dom Pedro I de centralizar o poder foi uma das principais razões de sua abdicação, em 1831.

– Essas elites regionais reformaram a Constituição da época para instaurar um arranjo federativo. Foram as próprias elites regionais que criaram o Estado federativo, ao contrário do que se diz – disse ela.

O seminário Desafios do Federalismo Brasileiro é promovido pelo Senado e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O evento, que acontece até esta sexta-feira (19), está sendo realizado no Senado, no auditório do Interlegis (veja a programação).

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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