Perillo nega relação com Cachoeira e diz que venda de casa foi legal

Anderson Vieira | 12/06/2012, 20h35

Em depoimento de mais de oito horas à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista que investiga as atividades criminosas de Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), negou ter qualquer relação de proximidade com o contraventor goiano. Disse jamais ter tido contato com o ex-dono da construtora Delta, Fenando Cavendish e informou ter vendido de forma legal e de boa fé a casa onde Cachoeira foi preso pela Polícia Federal em fevereiro deste ano.

No mais concorrido e longo depoimento já colhido pela comissão desde que começou seus trabalhos em 25 de abril, o governador disse que está sendo vítima de uma “grande injustiça, originada em ataques odiosos e sem limites”. E fez questão de ressaltar que foi à comissão de forma voluntária. Também aproveitou para listar feitos do governo do Estado de Goiás. A seguir, os principais pontos do depoimento.

Cooptação de policiais

Marconi Perillo recorreu aos números para se defender da acusação de que a quadrilha de Cachoeira cooptava policiais no Estado:

– Temos 12 mil PMs em atividade e 3 mil policiais civis. Destes, 34 foram indiciados pela Polícia Federal. Todos tiveram armas e carteiras recolhidas e foram afastados de suas funções imediatamente. Hoje estão respondendo a processos administrativos – explicou.

Proximidade com Cachoeira

Mais uma vez o governador recorreu aos números ao lembrar que, em três anos de investigação e em 30 mil horas de gravações, não há registro de nenhuma ligação telefônica entre ele e Carlos Cachoeira.

– Se fôssemos próximos, obviamente ele teria acesso a meus telefones particulares e os do meu gabinete. A própria investigação faz prova a meu favor. Como pode uma pessoa ter ligação comigo se em três anos de monitoramento, não há sequer uma ligação para mim? – indagou.

Marconi disse que não pode ser responsabilizado por diálogos de terceiros e reconheceu ter ligado apenas uma vez para Cachoeira para lhe dar parabéns pelo aniversário.

– Estava numa reunião social na casa de amigo quando um dos presentes disse que era aniversário e perguntou se eu não queria falar com ele. Naquele momento, eu estava ligando para um empresário da indústria farmacêutica e não para um contraventor – alegou.

Delta

O governador afastou a possibilidade de favorecimento da Delta por parte do governo do Estado, ao afirmar que a empresa detém apenas 4% do total de contratos da Agência Goiana de Transportes e Obras Públicas (Agetop). Marconi Perillo salientou que, de um universo de mais de R$ 1 bilhão, a Delta tem apenas R$ 51 milhões. Ressaltou ainda que, entre 2008 e 2012, a empresa participou de 140 processos licitatórios e conseguiu 19 contratos, sete no governo dele.

– Não há influência, sobrepreço, esquema com empreiteiros ou propina. Desafio uma auditória nas obras do meu governo. É evidente que não há lógica nas acusações de influencia em licitações ou poder paralelo - disse. Ele ainda negou ter recebido  dinheiro da Delta para campanha eleitoral de 2010. “Deve ter feito a outras campanhas, para mim, não.”

Demóstenes Torres

Sobre o senador acusado de participar do esquema de Cachoeira, o governador Perillo admitiu que estimulou a candidatura dele à prefeitura de Goiânia, e que chegou a aceitar algumas indicações para contratação feitas pelo parlamentar.

– Todos queriam o apoio do senador que tinha enorme prestígio. Demóstenes foi muito paparicado por empresários, sociedade goiana e políticos locais pelo trabalho que realizava. Ele me apoiou na campanha do primeiro ao último dia.

Chefe de gabinete

A respeito de Eliane Pinheiro, ex-chefe de gabinete acusada pela PF de vazar informações sobre operações policiais, Perillo informou que ela trabalhou por 20 anos para diferentes governos. Eliane atendia políticos e parlamentares e não tinha poder de ordenar despesas nem nunca lhe pediu nada. Perillo também disse não saber da existência de aparelho de telefone da Nextel pago por Cachoeira em poder de Eliana.

– Ela saiu do governo porque se sentiu constrangida depois das denúncias. Só depois ela me informou que tinha relações pessoais com a família de Cachoeira.

Wladimir Garcez

Marconi Perillo esclareceu que conhece Wladimir Garcez há mais de 20 anos no meio político e disse que mantinha apenas encontros esporádicos por serem companheiros de partido. Perillo admitiu que Garcez levava pleitos da Delta Centro-Oeste ao governo, mas nunca pediu nada em nome de Cachoeira.

– Em alguns dos contatos, ele me pediu para ajudar a irmã dele, que era suplente na Câmara de Goiânia, a assumir o mandato de vereadora. Também me indicou algumas nomeações, o que é normal. Todo os dias recebemos estes tipos de pedidos – disse. Em relação à venda da casa, afirmou não acreditar que Garcez tenha sido “laranja” na negociação.

Luiz Carlos Bordoni

O governador negou que uma empresa do esquema do contraventor tenha pago uma despesa de sua campanha eleitoral de 2010 mediante o depósito de R$ 45 mil na conta bancária de Bruna Bordoni, filha do jornalista Luiz Carlos Bordoni. E ainda afirmou que já está processando Bordoni por calúnia, injúria e difamação.

– Todas as contas de minha campanha foram legais. Minha campanha pagou a Luiz Carlos Bordoni R$ 33.300. Cabe a esse jornalista provar o que está dizendo. Cabe ao acusador o ônus da prova – disse em tom de irritação.

Venda da casa

Perillo disse que nunca se preocupou em saber a origem dos recursos pagos pelo comprador, o ex-vereador Wladimir Garcez, apontado pela Polícia Federal como operador do esquema de Cachoeira.

– Quando a casa foi colocada à venda em anúncios de jornal, Wladimir entrou em contato e manifestou interesse. Acertamos o valor de R$ 1,4 milhão, que se daria em três parcelas, março, abril e maio [de 2011]. Todos os cheques foram depositados e compensados, na mais absoluta prova de boa fé.

De acordo com o governador, a escritura só foi passada depois que os três cheques foram compensados e, de acordo com Perillo, se alguém tirou vantagem do negócio, foi sem o conhecimento dele.

Caça-níqueis

O chefe do Executivo goiano esclareceu que, desde que os jogos eletrônicos (caça-níqueis) foram legalmente proibidos, a prática passou a ser combatida em Goiás. Segundo ele, até maio deste ano, 845 termos circunstaciados de ocorrência (TCOs) foram lavrados e 2.570 máquinas caça-níqueis foram apreendidas.

– Há gravações de Cachoeira reclamando do duro combate policial ao jogo ilegal. È uma demonstração de como a policia agiu contra a contravenção e outros crimes organizados – defendeu-se.

Servidores

Ao responder ao senador Pedro Taques (PDT-MT), Perillo negou a existência de 100 servidores indicados por Cachoeira no governo do Estado. O governador alertou para a existência de 160 mil funcionários públicos estaduais e, deste universo, seis foram acusados de serem protegidos do grupo criminoso do contraventor.

Aliados

O governador defendeu alguns dos principais colaboradores do governo de Goiás, citados nas investigações da Polícia Federal, ao dizer que não tem informações que desabonem Edivaldo Cardoso, ex-presidente do Detran goiano, que teria sido indicado por Cachoeira para o cargo; Lúcio Fiúza, assessor para Assuntos Sociais, que representou o governador na formalização da venda da casa em Goiânia; e Eliane Pinheiro, ex-chefe de gabinete do governador, citada como uma das pessoas que receberam telefones específicos para conversas com o contraventor.

Cavendish e Cláudio Abreu

Marconi Perillo disse que não conhece e nunca conversou com Cavendish. Já esteve com Claudio Abreu (ex-diretor da Delta Centro-Oeste) uma vez, na casa de Demóstenes Torres e uma ou duas vezes durante a campanha.

Lula

O governador evitou falar sobre mensalão e, quando foi perguntado sobre o assunto, disse apenas que denunciou o esquema ao presidente Lula em 2005. O governador reconheceu, todavia, que nunca imaginou que o aviso pudesse trazer “tantos problemas e perseguição”.

– O foco desta CPI não é o mensalão. Não vou voltar a este tema. Não guardo rancor – resumiu.

* Outras versões para a venda da casa até agora colhidas pela CPI:

Polícia Federal: Primeiro a depor na CPI, o delegado da PF Matheus Mella Rodrigues diz que a casa foi paga com três cheques nominais a Perillo, assinados por Leonardo de Almeida Ramos, sobrinho de Cachoeira. O cheques são da Excitant confecções, que pertence à cunhada de Cachoeira.

Wladimir Garcez: Ao se explicar à comissão, o ex-vereador de Goiânia disse que comprou a casa de Perillo por R$ 1,4 milhão, com dinheiro emprestado por Cláudio Abreu, ex-diretor da Delta Centro-Oeste, e por Cachoeira. O valor lhe foi passado em três cheques. Nesta terça-feira (12), ao jornal O Globo, Wladimir disse que o negócio foi na ordem de R$ 2 milhões e não de R$ 1,4 milhão como havia dito anteriormente à CPI. A diferença se deve ao valor dos móveis (R$ 500 mil), que foram vendidos juntamente com a casa, e à corretagem de R$ 100 mil recebida por ele.

Walter Paulo Santiago: Informou aos congressistas ter comprado o imóvel por R$ 1,4 milhão em dinheiro vivo, em notas de R$ 50 e R$ 100 embrulhadas em “pacotinhos”. O valor, segundo ele, incluía o mobiliário. Santiago ainda disse que, o dinheiro foi entregue para Vladimir Garcez e para Lúcio Fiúza, ex-assessor do governador. À CPI nesta terça-feira, Marconi Perillo disse que Fiúza nunca comentou nada sobre tais pacotinhos.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)