Renan defende agilidade no poder judiciário

“Nesse sentindo a mediação e arbitragem podem ajudar no acesso e na agilização da justiça, como institutos alternativos à Justiça comum e dessa forma, podem desafogar os nossos tribunais”, acrescentou Renan.
20/11/2014 20h55

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), participou nesta quinta-feira (20), na sede do Conselho da Justiça Federal (CJF), do seminário “Como a mediação e a arbitragem podem ajudar no acesso e na agilização da Justiça?”. Em discurso Renan Calheiros afirmou que “o modelo tradicional de jurisdição tem se revelado insuficiente para solucionar, em tempo razoável, os conflitos de nossa sociedade”. “Nesse sentindo a mediação e arbitragem podem ajudar no acesso e na agilização da justiça, como institutos alternativos à Justiça comum e dessa forma, podem desafogar os nossos tribunais”, acrescentou Renan.

Renan defende agilidade no poder judiciário. Foto: Jonas Pereira

Atualmente cerca de 90 milhões de causas aguardam julgamento do Poder Judiciário brasileiro. O presidente Renan Calheiros (PMDB-AL) destacou ainda o excesso de leis. “A extravagância legislativa produz insegurança coletiva, confunde o cidadão, atrapalha a atividade do Poder Judiciário e apresenta caminhos demais e saídas de menos”, salientou. Renan defendeu uma Justiça moderna e mais ágil.

O Senado Federal aprovou no final de 2013 um projeto elaborado por comissão especial de juristas presidida pelo Ministro Luís Felipe Salomão, que busca dar agilidade ao julgamento de causas. No momento o texto aguarda votação na Comissão de Constituição e Justiça, da Câmara dos Deputados para aprovação da redação final.

Além do presidente do CJF e do Superior tribunal de Justiça (STJ), ministro Francisco Falcão, o seminário contou ainda com as presenças do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski; do Corregedor-geral da Justiça Federal, ministro Humberto Martins; do coordenador científico do evento, ministro Luis Felipe Salomão e de outros especialistas da área acadêmica e jurídica. O encontro, que segue até sexta-feira (21), é uma iniciativa do CJF em parceria com o STJ.

 

Discurso do Presidente do Senado Renan Calheiros:

Como todos sabemos, e podemos constatar em qualquer tribunal brasileiro, o modelo tradicional de jurisdição tem se revelado insuficiente para solucionar, em tempo razoável, os conflitos de nossa sociedade.

E de pronto respondo à questão-tema proposta para esta conferência: a mediação e arbitragem podem ajudar no acesso e na agilização da justiça, na medida em que se oferecem como institutos alternativos à Justiça comum e dessa forma, podem desafogar os nossos tribunais.

Atualmente o Poder Judiciário brasileiro possui cerca de noventa milhões de causas para julgar. Acontecem situações na vida em que as partes não se entendem e recorrem ao Poder Judiciário para solucionar o problema.

As situações de litígio envolvem pessoas, famílias, empregadores, empregados, consumidores, convivendo dia após dia, mês após mês, ano após ano, com a angústia da prolongada indefinição de seus problemas.

O contexto é alimentado por uma crescente cultura da litigância, da qual apenas um bem conduzido processo educativo dará cabo.

Outro ponto de estrangulamento está no excesso de leis. A extravagância legislativa produz insegurança coletiva, confunde o cidadão, atrapalha a atividade do Poder Judiciário e apresenta caminhos demais e saídas de menos.

Uma Justiça moderna e ágil, como instrumento democrático, de cidadania e de pacificação social, exige menos leis e leis mais claras.

O magistrado brasileiro suporta o maior volume de trabalho do mundo e também é vítima de equívocos históricos que a todos nós cumpre reparar.

O ideal seria que o direito sempre se realizasse espontaneamente. Como isso não acontece, os litígios devem ser solucionados com celeridade, evitando que se eternizem no tempo.

Este era – e ainda o é – o diagnóstico, quando criamos em abril de 2013, a comissão especial de juristas presidida pelo Ministro LUÍS FELIPE SALOMÃO, em nome de quem o Senado Federal rende suas homenagens pelo trabalho ágil, profícuo e extremamente denso na elaboração de um anteprojeto que muito contribuiu para acelerarmos a votação do tema.

O anteprojeto foi entregue em outubro do ano passado e  aprovado no final de 2013 pelo Senado Federal, seguindo para a Câmara dos Deputados, onde se encontra, neste momento, na Comissão de Constituição e Justiça para aprovação da redação final.

Em política a menor distância entre dois pontos é a vontade, é o querer fazer. Observem que, em um Parlamento pulverizado pelo excesso de legendas, extremamente politizado, recheado de questões regimentais, obstruções políticas e esvaziado pelas eleições gerais agora no segundo semestre, conseguimos com que este projeto evoluísse num ritmo muito adequado.

Estamos  na reta final para dar ao Brasil uma ferramenta ágil de resolução de conflitos.

 

Senhoras e Senhores,

É inevitável que a vida em sociedade gere conflitos de interesses. Com a evolução da humanidade e a institucionalização das interrelações entre os cidadãos e as comunidades em que vivem, a solução primitiva de soluções privadas foi sendo substituída gradativamente por um terceiro que, isento de interesses naquele caso específico, decidia.

Até que o Estado arrogasse para si a incumbência desse terceiro, com o estabelecimento de uma instância judicial, muito tempo se passou.

Contudo, infelizmente a mediação e a arbitragem – que se viram restringidas a áreas específicas - foi cedendo espaço para a judicialização dos conflitos, até que hoje temos a necessidade de valorizá-las e popularizá-las.

Como método institucionalizado, a arbitragem remonta há mais de três mil anos, com os babilônicos que a ela recorriam para resolver seus conflitos de forma amigável.

Os gregos, por sua vez, ao estender as decisões arbitrais para outras áreas do Direito, tornou-a comum nas querelas entre as cidades-estados. Durante o Império Romano, a arbitragem era sempre utilizada para resolver os conflitos da população plebeia, pois a justiça comum era tão somente para os nobres e os sacerdotes.

O instituto é muito utilizado no Canadá e nos Estados Unidos da América, onde a arbitragem é lecionada nas Faculdades de Direito. A Europa, berço do milenar instituto da arbitragem, prestigia os modelos alternativos de solução de litígios.

Na França, por exemplo, desde 1987 existem os conciliadores leigos, designados pelo presidente do tribunal de apelação com a missão de estimular a possibilidade de acordo.

No Brasil, como os senhores e senhoras bem o sabem, a arbitragem começou a ser implementada a partir de 1850, quando se tornou compulsória nos contratos de locação mercantil. Mas tal juízo não se manteve por muito tempo, e dezesseis anos depois, infelizmente, foi extinto.

Contudo, já em 1867, com influência das relações marítimas voltou a se a falar da justiça arbitral. Mas longo lapso de tempo se deu até que na década de 80 do século passado três anteprojetos de leis tramitaram no Congresso Nacional com propostas de modernização da arbitragem. Sem êxito, contudo.

Foi tão somente com o advento da Constituição de 1988 que os tribunais arbitrais receberam inscrição própria na Carta Magna, ao facultar às partes de uma demanda na Justiça do Trabalho a opção pela arbitragem, caso restasse frustrada a negociação coletiva.

Entretanto, maior fôlego teve a arbitragem em nosso país somente em 1996, com a promulgação da Lei 9307, que deu contornos mais claros à arbitragem erigindo-a como uma alternativa válida determinados tipos de demandas, nas quais prevalece o princípio da disponibilidade da vontade das partes sobre a justiça material dos seus bens.

Essa autonomia da vontade das partes é, aliás, um valor típico das sociedades democráticas que permitem, tanto quanto possível, que o cidadão delibere sobre sua vida.

Nesse sentido, a arbitragem faculta ainda que sejam utilizadas regras escolhidas pelos próprios litigantes, o que sem dúvida alguma é elemento positivo para o respeito à decisão tomada pelo árbitro.

Outra vantagem excepcional da arbitragem é a possibilidade de escolha de árbitros mais bem preparados para lidar com questões inerentes aos seus conhecimentos específicos.

Tal prerrogativa não é dada a quem prefere o processo judicial, no qual a existência de questões técnicas exige que os juízes recorram a peritos, o que muitas vezes dificulta a tomada de decisão pela ausência de familiaridade com a matéria.

Vantagem ainda mais valiosa da arbitragem é a discrição oferecida em todas as fases dos procedimentos, desejável muitas vezes para contendas que envolvem questões de família ou nas quais é necessário preservar segredos empresariais.

Além de todas essas virtudes é possível ainda citar a possibilidade de imprimir maior tempestividade à tutela jurisdicional, o que significa apaziguamento social mais rápido e menor dispêndio financeiro.

Não por outro motivo, duas características intrínsecas do julgamento judicial tradicional, ou seja, a o tempo e o custo são dois grandes entraves que muitas vezes afastam e desestimulam a busca da população por justiça.

Apesar de todas essas qualidades, a Lei 9307, nessa década e meia de existência, foi pouco utilizada.

Na proposta de aperfeiçoamento da Lei 9.307 tivemos o cuidado de preservar a sua estrutura que é enaltecida pelos especialistas. O nosso intuito foi o de entregar à sociedade brasileira uma ferramenta moderna capaz de cumprir com maior eficácia e abrangência o seu papel pacificador.

A proposta prevê a possibilidade de utilização da arbitragem em contratos trabalhistas, e a admite para dirimir conflitos societários, com cláusula (prevendo a arbitragem) a ser instituída por assembleia de acionistas, assegurado o direito de retirada dos sócios minoritários se discordarem da deliberação.

E autoriza ainda a utilização da arbitragem nas relações de consumo, restrita aos casos em que o próprio consumidor tome a iniciativa de invocar o instituto.

Creio que quando estiver em vigor a nova lei de arbitragem irá contribuir efetivamente desafogar o Poder Judiciário do imenso volume de processos em tramitação. Essa, aliás, é uma causa que sempre abracei, seja no período em que ocupei o cargo de Ministério da Justiça, seja no Congresso Nacional muito me empenhei para a reforma constitucional do Poder Judiciário, para a criação e fortalecimento dos Juizados Especiais, além da Súmula Vinculante, da Repercussão Geral e da implantação do processo eletrônico. Avançamos na reforma dos códigos Penal, do Processo Penal, do Processo Civil.

Quanto à proposta de aperfeiçoamento da lei da arbitragem gostaria de reiterar, finalmente, que ao contrário do que muitos pensam os chamados métodos alternativos de resolução de conflitos são aliados do Poder Judiciário. Eles concretizam e ampliam o acesso à justiça, com rapidez, seriedade, informalidade e eficácia.

Não por outra razão em seu discurso de posse na presidência do Supremo Tribunal Federal, o Ministro Ricardo Lewandowski realçou a necessidade de valorização dos mecanismos alternativos de solução de conflitos, defendendo enfaticamente a conciliação, a mediação e a arbitragem.

“Os conflitos menores”, disse ele, “não precisam, necessariamente, ser levados ao Judiciário. Eles podem ser resolvidos pela sociedade”.

A arbitragem e a mediação são ferramentas eficazes que complementam um sistema de distribuição de justiça mais ágil e capaz de atender a todos e de dar respostas eficientes e seguras, assegurando a igualdade entre os cidadãos, livrando o Poder Judiciário de processos inúteis e aperfeiçoando o Estado democrático de Direito.

Muito obrigado a todos.