Ligação de outra cidade pela mesma operadora de celular pode deixar de ser taxada

jornal-do-senado | 24/11/2015, 10h52

Projeto aprovado este mês no Senado e que segue para a Câmara dos Deputados proíbe a cobrança de taxas por chamadas feitas ou recebidas quando o assinante está fora da localidade de registro do seu telefone móvel, a não ser que precise utilizar a rede de uma outra prestadora

Quem usa o telefone celular em outras cidades paga taxas não só pelas ligações que faz, como pelas que recebe. Hoje, para evitar a cobrança de roaming de dados, ou seja, de taxa pelo uso da linha fora da área de registro, é preciso ter um pacote de telefonia com ampla cobertura.

Projeto aprovado pelo Senado pretende extingir a cobrança de roaming nacional e de adicional por chamada (AD) em localidades atendidas pelas mesmas redes de telecomunicação da operadora de telefonia móvel contratada pelo usuário.

As taxas de roaming são cobradas pelo deslocamento, dependendo da localidade, enquanto o AD é uma taxa fixa por cada chamada feita.

O PLS 85/2013, de Valdir Raupp (PMDB-RO), proíbe a cobrança no caso de ligações originadas e finalizadas em redes de empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico. No caso de infração, haverá penalidades.

Na prática, fica livre das tarifas aplicáveis o assinante da operadora “A” que estiver em localidade fora da área de registro de sua linha se nesse local estiver usando a rede dessa mesma operadora “A” para fazer ou receber chamadas. Porém, é mantida a permissão de cobrança se a operadora acionada for distinta.

Validade

Raupp sustenta, na justificação do projeto, que a cobrança do roaming tinha sentido no início da telefonia celular, quando as empresas precisavam se utilizar das redes de outras operadoras para evitar que os assinantes ficassem sem acesso aos serviços de telefonia móvel.

Ele diz que esse argumento não é mais válido, pois, hoje, quase todas as operadoras utilizam suas próprias redes, agora nacionalizadas.

A matéria foi aprovada este mês na Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI), em decisão terminativa, e segue agora para a Câmara. Se for acolhida pelos deputados sem modificações, irá à sanção presidencial. Não havendo veto, entrará em vigor assim que for publicada. Antes, no Senado, a proposta havia passado pela Comissão de Ciência e Tecnologia (CCT).

Raupp registra que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) vem estudando o fim desse tipo de cobrança. “Apesar de já haver essa intenção, entendemos que o meio mais adequado é a lei, por questão de segurança jurídica”, reforça.

Encargos

O relator na CI, Walter Pinheiro (PT-BA), que recomendou a aprovação do projeto, observa que a cobrança das taxas de roaming e de deslocamento é uma licença concedida às operadoras. Assim, a seu critério, elas podem ou não efetivar a cobrança. As empresas, inclusive, já comercializam planos de serviços que dispensam esses encargos, sobretudo em situação similar à do projeto, quando as chamadas em roaming são originadas ou terminadas dentro da própria rede.

— As empresas fazem disso um atrativo para que os assinantes possam migrar para seus serviços. Portanto, isso demonstra que esse não é um custo que esteja prejudicando as operadoras — salienta.

Para o senador, fica evidente que as empresas estão começando a optar por ganhos de escala, aumentando o aproveitamento da rede com a inclusão de mais clientes e melhores pacotes de serviços, do que pela insistência em cobrar tarifas por custos já superados.

Na sua avaliação, é importante seguir ajustando a Lei Geral de Telecomunicações (Lei 9.472/1997) para estimular o serviço móvel pessoal a avançar na eficiência e produtividade, sem a necessidade de “ supertarifas”.

— Ganha o usuário, que poderá falar mais sem pagar tarifas extras, e ganham as empresas, pela conquista de mais usuários ou pelo aumento do volume de serviços prestados a cada cliente — avaliou.

Mercosul

Na União Europeia, a tarifação de roaming deixará de ser cobrada inclusive para chamadas entre os países desse bloco econômico, diz Pinheiro. A previsão é que a medida comece a valer em abril de 2017.

— Esse é um desafio que temos que começar a pensar para o Mercosul e mesmo para países de outros continentes.

A associação de consumidores Proteste viu como notícia promissora a aprovação do PLS 85/2013 no Senado. A decisão ocorreu três meses depois que a entidade promoveu campanha pelo fim do roaming, mobilizando quase 25 mil pessoas. Uma petição pelo fim das taxas adicionais foi encaminhada à Anatel, que regula o setor.

— Esperamos agora que os deputados demonstrem a mesma sensibilidade em relação ao tema que tiveram os senadores e aprovem o quanto antes o projeto — comentou Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Proteste.

Para ela, é totalmente descabido tarifar o consumidor por um custo inexistente desde que as operadoras estruturaram redes em escala nacional. Segundo Maria Inês, a campanha promovida pela entidade e a própria intervenção do Legislativo no assunto seriam desnecessárias se a Anatel já tivesse cumprido seu papel, retirando a previsão de cobrança dessas taxas de seus regulamentos.

A Associação Nacional das Operadoras Celulares (Acel), que congrega as prestadoras do serviço móvel pessoal, considera inconveniente a aprovação do projeto. No seu portal na internet, a entidade menciona que as empresas já vêm, promocionalmente, isentando os clientes da cobrança.

A entidade cita o trabalho de revisão da regulamentação dos serviços em andamento na Anatel. Para a Acel, sempre que possível, a melhor solução é manter o detalhamento da disciplina dos serviços dentro dos limites normativos da agência, a seu ver detentora de “maior flexibilidade para atender às rápidas mudanças que caracterizam o setor de telecomunicações”.

Em viagens, consumidores preferem utilizar aplicativos de troca de mensagens, dizem consultores

Para a bancária aposentada Marli Oliveira Lima, de Brasília, poucas coisas são tão prazerosas quanto viajar. Com a chegada da aposentadoria, arrumar as malas e partir para um novo roteiro passou a ser hábito frequente. Mas o impulso de pegar o celular para manter contato com a família acabou contido depois de ver a conta de telefonia subir a cada retorno. Culpa das taxas extras de roaming pagas pelo uso da linha fora da área original de registro.

— É terrível essa cobrança, um estraga-prazer das viagens — afirma.

Marli revela que chegou a pagar uma conta de quase R$ 500 em um mês no qual viajou, muito acima do limite do seu plano pós-pago, no valor de pouco mais de R$ 180 mensais. E se viu, repetidas vezes, diante de fatura ao menos no dobro do valor do pacote contratado.

Hoje, para evitar aborrecimentos, sempre que possível, ela desativa a função roaming.

Temor

O consultor do Senado Dilson Ferreira observa que a insegurança sentida pelo usuário em usar a linha de celular fora da área de origem, pelo temor do custo da conta, acaba resultando em perda de receitas para as operadoras. Para afastar o risco de uma conta de valor imprevisível, afirma, os assinantes migram para os serviços multiplataforma, em detrimento do uso da linha telefônica.

— Com a popularização da internet, as pessoas preferem ficar nos locais onde possa ter acesso via wi-fi gratuito e usar a internet para se comunicar — constata.

No caso de Marli, a comunicação com irmãos e amigos agora é feita por meio do WhatsApp, o mais popular aplicativo multiplataforma pelo celular, para troca, até agora gratuita, de mensagens de texto ou voz. Para isso, basta encontrar uma área com cobertura de internet wi-fi.

— Fui bem instruída por uma sobrinha sobre todas as novidades tecnológicas — comenta.

Tráfego

Por isso, Dilson Ferreira avalia que o fim da cobrança das tarifas de roaming deve beneficiar as próprias empresas de telefonia móvel, um aspecto que, a seu ver, ainda não foi adequadamente percebido pelos agentes do mercado. Sem o temor da tarifação, observa, as pessoas passam a contar com um estímulo para usar a sua própria linha celular para as chamadas de voz.

Segundo ele, o resultado deve ser o aumento do tráfego de chamadas, sem custos adicionais para as operadoras. Como já contam com redes próprias em todo o país, observa o consultor, elas não têm mais que pagar pelo uso das plantas de telecomunicações das concorrentes para que seus assinantes continuem conectados em qualquer lugar em que estejam.

— Na verdade, as empresas não vão perder em nada, porque elas já não incorrem nesses custos. Então, acabar com a cobrança de roaming é só uma questão de fazer justiça com o processo de tarifação — afirma.

Previsibilidade

Rodrigo Abdalla, também consultor do Senado, destaca o ganho em previsibilidade que o consumidor terá em relação ao valor da conta com o fim das taxas de roaming.

Com a medida, afirma, o assinante vai saber exatamente quanto pagará, já que os custos serão muito mais comparáveis entre as operadoras.

Como hoje os planos são muito diferentes entre si, ele diz que o consumidor nem sempre consegue perceber as discrepâncias entre os valores cobrados, até porque esse não é um serviço que usa regularmente.

— Então, frequentemente isso causa surpresa ao consumidor que recebe a conta e ainda para aquele que utiliza seu celular pré-pago, porque o roaming se reflete no término antecipado dos créditos que ele havia previsto para usar dentro de certo período — explica.

Já há oferta de planos e pacotes sem adicional para outros DDDs

Em agosto, a Proteste divulgou que o gasto do consumidor com o pagamento das tarifas podia chegar a R$ 550 por ano, no caso de uso de telefone pré-pago, com recebimento ou realização de 20 ligações de longa distância dentro de um mês, com duração de 1,5 minuto cada uma.

Na Europa, o roaming será extinto em 15 de junho de 2017, registra a Proteste. Nos Estados Unidos e no Canadá, segundo a entidade, a cobrança existe em alguns planos e operadoras. Quanto ao mercado nacional, o fim das taxas de roaming já é uma realidade, mas não para todos os tipos de planos de serviço.

As empresas de telefonia começaram há algum tempo a ofertar planos livres de custo de roaming para os planos pós-pagos, normalmente pacotes promocionais que, apesar dos preços mais elevados, permanecem sem esse tipo de taxação adicional ao longo do tempo.

Efeito clube

As operadoras costumam dispensar a cobrança sobretudo para chamadas entre linhas de assinantes da mesma operadora. Uma das consequências é que alguns consumidores adquirirem chips diferentes, de várias operadoras.

Outra é o reforço do chamado efeito clube, quando assinantes combinam com parentes e amigos que moram em outras localidades de assinarem planos da mesma operadora para falar com mais liberdade, sem o peso dos custos de roaming.

O efeito clube já ocorria dentro de áreas com o mesmo DDD, por conta da oferta de serviços sem custos adicionais para ligações entre linhas da mesma operadora. Depois que as operadoras passaram a ter redes em escala nacional, o mercado de telefonia começou a trabalhar com planos em que a franquia de minutos também pode ser utilizada para ligações entre diferentes DDDs.

E agora começam a surgir pacotes sem taxa de roaming para qualquer que seja a operadora de destino, inclusive em planos pré-pagos. No início de novembro, a Tim anunciou pacotes com esse formato. Imediatamente depois, foi a vez de a Claro acabar com diferença de preços para outras prestadoras.

O que mais distingue os planos é a variação do pacote de megabytes de acesso à internet. É um indicativo que reforça a ideia de que os smartphones serão cada vez menos utilizados para “falar” e mais para outras funções, como navegar na internet, prover acesso às redes sociais, baixar músicas, ver filmes e jogar on-line.

Cobrança de roaming veio do uso das redes de outras prestadoras

A cobrança de roaming é disciplinada por regulamentos da Anatel, mas as empresas são livres para cobrar ou não pelos serviços. Na prática, são duas modalidades distintas de tarifas que podem ser repassadas ao usuário nas ligações entre linhas de celular de diferentes áreas de registro: o adicional por chamada (AD) e a chamada de longa distância (VC-2 ou VC-3).

No caso do AD, a cobrança pode incidir tanto na conta de quem faz quanto na de quem recebe a chamada entre diferentes DDDs, dependendo de quem esteja fora da área de registro da linha.

O consultor Rodrigo Abdalla explica que, no passado, o AD servia para remunerar a prestadora que recebia o assinante em roaming. Como cada prestadora tinha área geográfica de atuação limitada, elas precisavam fazer parcerias comerciais para que os usuários pudessem usar a rede da área em que se encontrassem quando viajavam.

Já a VC serve para remunerar a prestadora de longa distância. No passado, eram apenas duas, a Embratel e a Intelig. Como as empresas do serviço móvel pessoal não podiam efetuar chamadas de longa distância, precisavam contratar uma dessas duas prestadoras.

— Com a convergência tecnológica e a consolidação econômica do setor, tais cobranças não fazem mais sentido, pois a maior parte das prestadoras já oferece o serviço nacionalmente ou passou a pertencer a um grupo que agora tem autorização para prestar o serviço de longa distância — explica.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)