Debate na CDH condena violência policial contra professores no Paraná

Iara Guimarães Altafin | 06/05/2015, 17h04

Indignação, tristeza e revolta foram sentimentos que permearam as apresentações de professores e sindicalistas do setor de Educação do Paraná, presentes à audiência pública desta quarta-feira (6) na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), que discutiu a violência policial contra servidores do governo do estado no último dia 29, em Curitiba.

Naquele dia, os docentes participavam de manifestação que reuniu mais de 20 mil servidores estaduais em Curitiba, na praça em frente à Assembleia Legislativa do estado, e foram reprimidos com violência pelas forças policiais do governo estadual. Os senadores pelo Paraná Roberto Requião (PMDB) e Gleisi Hoffmann (PT) presenciaram o confronto e foram enfáticos ao relatar a brutalidade da ação policial, que deixou mais de 200 manifestantes e 20 policiais feridos.

— Surgiram helicópteros jogando bomba de gás lacrimogêneo indiscriminadamente. Hoje, o paiol de munição da Polícia Militar do Paraná está vazio, eles praticamente jogaram todo seu estoque de bombas de efeito moral e explosivas em cima da população — disse Requião.

Ao pedir a apuração de responsabilidades de todos que estavam no comando da operação, Gleisi Hoffmann disse não ver justificativa para tamanha violência empregada contra trabalhadores.

— Foram duas horas ininterruptas de bombas e não era para defender o prédio da Assembleia, não tinha justificativa. As balas de borracha continuavam sendo atiradas e os professores pediam que parassem com a violência, mas eram tratados como bandidos. É essa a dor que as pessoas estão falando. Não é a dor física, que pode até passar. É a dor moral, a dor emocional, a dor de saber que aquele que deveria te proteger, te desrespeita — frisou a parlamentar.

Durante o debate, a comissão recebeu, pela internet, cerca de quatrocentas mensagens criticando a ação do governador do Paraná e questionando a falta de diálogo com os professores, conforme informou o senador Paulo Paim (PT-RS), presidente da CDH.

— Essas mensagens mostram que o país todo está acompanhando e discorda dessa ação — observou Paim. O senador informou que foi aprovado na CDH voto de censura ao governo do Paraná, medida também aprovada na Comissão de Educação (CE).

Rompimento de acordo

No debate, professores e sindicalistas acusaram o governador Beto Richa de romper compromisso de discutir com servidores propostas de mudança nas regras da Previdência estadual, antes da votação da matéria na Assembleia Legislativa do estado. No dia do confronto, os servidores se manifestavam contra rito sumário de exame do projeto. Os convidados para o debate na CDH refutaram argumentos de que os policiais foram chamados para evitar que a assembleia fosse invadida pelos manifestantes.

— Quando um governo quer proteger o patrimônio público, coloca a tropa na frente do prédio. O que fez o governador foi cercar o centro cívico, cercar os manifestantes com tropa por todos os lados, com cachorros e com dois caminhões de policiais com cavalos — relatou a professora Luzia Marta Belini, diretora do Sindicato dos Docentes da Universidade Estadual do Paraná.

Os docentes também negam alegação do governador do Paraná de que o projeto teria sido discutido com as entidades representativas dos servidores do estado.

— Desafio o governador que nos mostre uma única ata assinada pelos sindicatos dos professores das universidades estaduais, de qualquer reunião sobre o PL 252/2015, que o governo diz ter sido amplamente discutido — frisou o professor Antonio Bosi, do Sindicato dos Docentes da Universidade Estadual do Oeste do Paraná.

O rompimento do diálogo por parte do governo estadual foi apontado por todos os professores e sindicalistas presentes ao debate na CDH, como Hermes Leão, do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública, e Denny Willian da Silva, professor da Universidade Estadual do Centro-Oeste do Paraná.

Também presentes ao debate, o deputado federal Paulo Pimenta (PT-PR), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, e os deputados estaduais Professor Lemos (PT) e Tadeu Veneri (PT) relataram a ação violenta de pelo menos 350 policiais dentro da Assembleia Legislativa do Paraná, inclusive com a utilização de cães. Em relato emocionado, o cinegrafista Luiz Carlos de Jesus, que participava de cobertura jornalística pela TV Bandeirantes, contou que foi atacado por um desses animais dentro da assembleia.

Defesa

Em defesa do projeto que altera regras da Previdência dos servidores do Paraná, Edson Lau Filho, assessor de Políticas para a Juventude do governo do estado e representante do governador Beto Richa no debate, apontou déficit no sistema, gerado pelo pagamento de aposentadoria integral aos servidores públicos.

— A capitalização das contribuições fica aquém da aposentadoria e a diferença é paga pelo poder público, com recursos oriundos da tributação. Os trabalhadores da iniciativa privada, na prática, acabam complementando o benefício dos servidores — disse.

Ao falar sobre o uso de força policial, o assessor afirmou que a ação se deu por solicitação do presidente da Assembleia Legislativa, para evitar que os manifestantes impedissem a sessão de votação, como havia ocorrido dois meses antes, na primeira tentativa de aprovação do projeto que altera as regras de aposentadoria dos servidores.

Também o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR) apontou a intenção dos manifestantes, no dia 29, de interromper os trabalhos da assembleia. Ele condenou excessos na ação da polícia, mas disse serem necessários os ajustes fiscais promovidos por Beto Richa, fazendo um paralelo com os ajustes promovidos pelo governo federal, por meio de medidas provisórias. Gleisi Hoffmann contestou a argumentação, dizendo que a tramitação de MPs permite ampla discussão das matérias no Congresso.

Na opinião dos senadores pelo PSDB Aloysio Nunes Ferreira (SP) e Cássio Cunha Lima (PB), a intervenção da força policial foi necessária para evitar que não se repetisse a invasão da assembleia legislativa.

— A Polícia Militar agiu legitimamente, atendendo a uma ordem judicial, mediante requisição da Assembleia Legislativa. Todos os fatos noticiados mostram que houve excessos em alguns episódios desse confronto. Penso que isso tem que ser investigado com rigor, mas queria também lamentar o fato de que movimentos sociais descambam para a violência na manifestação de suas propostas e contra medidas com as quais eles não concordam — opinou Aloysio.

No mesmo sentido, Cássio Cunha Lima pediu a apuração das responsabilidades pelos excessos, mas cobrou dos manifestantes o cumprimento das leis.

— A democracia existe quando as regras são respeitadas. Na democracia, é legítimo que as pessoas pensem e ajam de maneira diversa, mas nunca afastadas da égide da lei — frisou.

Despreparo

Já a ouvidora da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Irina Karla Bacci, apontou a falta de diálogo do governo do estado com os professores como uma das causas do confronto em Curitiba. Conforme observou, não apenas no Paraná, mas também em outros estados tem sido observado despreparo dos governantes no gerenciamento de manifestações de massa.

Na opinião de Claudio Pereira de Souza Neto, secretário-geral do conselho Federal da OAB, a democracia brasileira ainda não foi capaz de mudar a orientação truculenta que caracteriza as polícias do país, que recebem “treinamento voltado para o combate, com protocolo de atuação voltado para a guerra”. Conforme informou, a OAB do Paraná não classificou como confronto, mas como massacre o episódio do dia 29, frente à violência utilizada contra os professores e o número de manifestantes feridos.

Também José Carlos Torves, diretor de Relações Institucionais da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), apontou distorção na formação de policiais militares e observou que os treinamentos utilizados pelas corporações ainda seguem modelo utilizado durante a ditadura militar.

Ao final do debate, o senador Paulo Paim informou que a CDH promoverá a construção de um projeto de lei visando proibir o uso de armas letais e não letais e o uso de cães por policiais responsáveis pela segurança em manifestações públicas. Revelou ainda que a comissão irá representar junto ao Sistema Internacional de Direitos Humanos, denunciando os fatos ocorridos no Paraná, conforme sugestão da senadora Gleisi Hoffmann.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)