Produtores e pesquisadores apoiam percentual mínimo de 35% de cacau no chocolate

Iara Guimarães Altafin | 01/04/2015, 15h58

Cacauicultores e pesquisadores que participaram de debate nesta quarta-feira na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) manifestaram apoio ao Projeto de Lei do Senado (PLS) 93/2015, que prevê percentual mínimo de 35% de cacau puro nos chocolates comercializados no país. Já a indústria de chocolate caseiro pede cautela na mudança de legislação, para não inviabilizar pequenos fabricantes.

De autoria da senadora Lídice da Mata (PSB-BA), o projeto torna obrigatória a informação do percentual total de cacau nos rótulos dos produtos e prevê punições a fabricantes ou importadores que desrespeitarem as normas. Determina ainda que a nova lei entrará em vigor 180 dias após ser publicada.

A senadora argumenta que o aumento da quantidade de cacau no chocolate ampliará o espaço do produto brasileiro no mercado e alinhará a lei brasileira a padrões já adotados na Europa e nos Estados Unidos. Ela ressalta, no entanto, que pretende ampliar o debate para que o projeto contribua com todos os integrantes da cadeia produtiva.

— Não temos pressa [em aprovar a matéria], temos compromisso em realizar um debate sério. Buscamos também que os produtores de chocolate tenham uma política de valorização do produto. Temos que sair da situação de sermos um país exportador de commodities para sermos um país que possa agregar valor a seus produtos — disse Lídice.

Ingrediente básico

José Schneider, presidente da Associação da Indústria e Comércio de Chocolates Caseiros de Gramado, apontou dificuldades na obtenção da massa ou liquor, ingrediente básico para a fabricação de chocolate, feito a partir do esmagamento da amêndoa do cacau.

Como explicou, as grandes fábricas fazem o esmagamento da amêndoa, mas as pequenas indústrias dependem das três esmagadoras existentes no país, que impõem um produto muitas vezes de baixa qualidade, não havendo fiscalização que garanta a proporção de cacau.

Ele é a favor de se prever na legislação o mínimo de 35% de cacau para que o produto seja considerado chocolate, mas diz não haver espaço nas embalagens para explicitar mais essa informação sobre a proporção. Schneider defende que a informação no rótulo seja obrigatória para produtos que não atendam esse mínimo e não são considerados chocolate.

— Aquele que não compõe o chocolate conforme a lei será obrigada a escrever uma pequena frase, dizendo que não é chocolate. Outro problema é a fiscalização. A Anvisa não fiscaliza, o povo brasileiro come e não sabe que não é chocolate — disse.

Schneider ressalta que o consumo médio no Brasil, de três quilos per capita, é ainda muito pequeno em relação à média na Europa, de nove quilos per capita, ou ao mercado alemão, de 11 quilos per capita. Afirma ainda que o consumidor brasileiro não estaria disposto a pagar um valor maior por um produto de melhor qualidade. Ele também pediu mais tempo para que as novas regras entrem em vigor, depois da publicação da lei.

Henrique Almeida, da Associação dos Produtores de Cacau da Bahia, concorda que as esmagadoras misturam na massa um cacau de baixa qualidade, como o importado da Indonésia, mas afirma que as medidas previstas no PLS 93/2015 irão dinamizar a cultura, explorada predominantemente pelo agricultor familiar, e toda a cadeia produtiva do chocolate.

— O projeto vem atender um sonho histórico e está em sintonia com o mercado europeu e norte-americano — disse, ao destacar a exigência do mercado consumidor europeu em termos de qualidade e percentual de cacau nos produtos.

O mesmo sentido, Guilherme Moura, presidente da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Cacau, defendeu a mudança na legislação brasileira e disse que a produção nacional é capaz de suprir o incremento de demanda.

Baixa rentabilidade

A produção brasileira para 2014 está estimada em 279 mil toneladas, conforme informou Helinton José Rocha, diretor da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), e está concentrada na Bahia (63%) e no Pará (35%), com participação ainda pequena de Rondônia, Amazonas, Espírito Santo e Mato Grosso.

A atividade já superou a crise causada pela praga conhecida como vassoura de bruxa e hoje já movimenta US$ 13 bilhões por ano. No entanto, disse Helinton Rocha, a expansão da cultura enfrenta o desinteresse dos jovens em permanecer no campo e continuar a atividade dos pais, pela baixa rentabilidade e a falta de serviços, em especial educação e saúde.

Conforme relatou, o produtor de cacau recebe cerca de 3% do valor obtido com a venda de chocolate, menos que os 5% que o governo arrecada do setor. As esmagadoras ficam com 7%, as transportadoras com 12%, os fabricantes de chocolate ficam com 20%, o marketing com 10% e a maior fatia, 43%, com os supermercados.

Proteção ambiental e saúde

Assim como na Bahia, também no Pará a produção está concentrada em unidades familiares de produção, como informou Luiz Pinto de Oliveira, representante governo do Pará. Uma das vantagens da cultura no estado, disse, é a recomposição do passivo ambiental, a partir da cacauicultura integrada à floresta.

Ao elogiar o projeto, Oliveira destacou que a proposta incentiva o consumo de chocolate de qualidade e seus efeitos benéficos à saúde da população.

— Mostra à sociedade que o chocolate faz à saúde da população, o que faz mal à saúde é o açúcar. Esse projeto empurra o açúcar para fora do chocolate e impõe o quantitativo de cacau necessário à melhoria de funções vitais do ser humano. Estou falando em chocolate bom, estou falando de chocolate que tenha acima de 35% de cacau, como está colocado no projeto.

No debate, o senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) elogiou Lídice da Mata pela iniciativa de apresentação do projeto e contou que em breve será instalada em seu estado uma indústria de chocolate.

— Já produzimos no Pará uma amêndoa de altíssima quantidade e precisamos aproveitar para agregar valor ao produto — frisou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)