Mulheres devem perder medo e denunciar casos de assédio, diz Luiza Eluf

Elina Rodrigues Pozzebom | 27/11/2014, 16h54

As mulheres devem perder o medo e entender que são seres humanos plenos de direito e, quando vítimas de assédio sexual, precisam se encorajar, juntar provas e denunciar seu assediador, seja para a direção da empresa, seja à justiça ou à polícia. Esse é o conselho da advogada e procuradora de Justiça aposentada do Ministério Público de São Paulo Luiza Nagib Eluf,

— Enquanto nós estivermos pensando que a mulher é fraca, nós seremos fracas. Enquanto tivermos medo, nós sofreremos abusos, agressão sexual, assédio no local de trabalho aos montes — alertou, durante explanação para o projeto “Quintas Femininas”,  promovido pela Procuradoria Especial da Mulher no Senado, nesta quinta-feira (27).  O debate integrou as atividades dos “16 Dias de Ativismo Pelo Fim da Violência Contra as Mulheres”.

Conscientização

Apesar das mudanças na legislação ao longo dos anos – até 1972, as mulheres não podiam ter bens e precisavam de autorização do marido para viajar, por exemplo — a cultura da submissão feminina ainda é muito arraigada na sociedade, inclusive entre algumas mulheres que são machistas e não reconhecem a sua condição feminina, explicou Luiza Eluf. Por isso, avalia a advogada, tanto medo de lutar por direitos humanos e sexuais e pelo tratamento igualitário, cidadão.  E, para ela, é imprescindível tornar as mulheres conscientes disso. "Livrar-se do medo é primordial", completou.

Segundo a advogada, as condenações por assédio sexual na Justiça do Trabalho são numerosas, mas em âmbito penal quase nunca ocorrem porque os magistrados alegam falta de prova. Essa realidade justifica o conselho de Luiza Eluf para juntar o maior número de evidências possíveis, desde gravações das conversas, chamar alguém para tentar ouvir o assédio, guardar bilhetes, emails ou fazer relatos ao psicólogo ou a um amigo, que podem ser arrolados como testemunhas posteriormente.

— Não tenham medo, ninguém pode mais do que aquela que está na sua razão, no seu direito. [Saiba que] criminoso é quem assedia, eu sou vítima. O Estado tem o dever, a incumbência legal, constitucional e cidadã de me defender — afirmou.

Luiza Eluf relatou inúmeros casos de violência contra a mulher que acompanhou em seus mais de 30 anos de atuação no Ministério Público de São Paulo. Também contou como foi a sua própria ascensão na carreira, permeada por tratamentos hostis, assédios e também por enfrentamentos dos quais saiu vitoriosa. Quando assumiu o cargo no Ministério Público, na década de 1980, havia apenas cinco procuradoras, que recebiam conselhos até sobre como se portar, se vestir e qual cor de tinta de cabelo poderiam utilizar. Segundo afirmou, ouviu muitas vezes a frase “isso não é coisa ou lugar de mulher”. Sua atuação rendeu diversos livros publicados sobre o tema.

Ela contou, ainda, que teve de subir numa mesa para ser ouvida durante as negociações para tentar tipificar o assédio sexual no Código Penal, em uma sala com outros dez homens, em 1991. A vitória só veio uma década depois, com a sanção da Lei 10.224/2001, que tornou crime o assédio sexual.

A lei, cuja elaboração contou com seu auxílio, estabeleceu pena de detenção de um a dois anos para quem praticar assédio sexual, que é caracterizado quando alguém for constrangido “com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual” por um superior hierárquico. Hoje, ela luta por aperfeiçoamentos na legislação em defesa da mulher. Integrou o grupo que trabalhou no novo Código Penal, uma iniciativa do Senado e concorreu ao Parlamento nas últimas eleições, ficando na terceira suplência de sua coligação. Como advogada, atua na defesa dos direitos das profissionais do sexo.

Parlamento

Maria da Conceição Lima, consultora legislativa do Senado para a área de direitos humanos, frisou a baixa representatividade feminina no Parlamento, o que em sua opinião, impacta na frequência e na quantidade de discussões sobre pautas de interesse da mulher. O próprio assédio sexual é pouco citado e debatido, até mesmo no relatório da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que tratou da Violência Contra a Mulher, encerrada em 2013.

O intrigante, disse, é que as mulheres são maioria na população, no eleitorado e está sub-representada, o que depõe contra as mulheres e o próprio sistema representativo.

— Não há como negar que os assuntos que dizem respeito às mulheres vão ser mais bem tratados quando o sistema representativo tiver menos um retrato masculino e patriarcal. Quem traz esses assuntos para dentro da Casa somos nós mesmas. Os homens são aliados, mas quem vai fazer avançar somos nós mulheres — declarou.

Na próxima legislatura, o Senado terá menos de 15% de senadoras. Na Justiça, explicou Luiza Eluf, é um pouco diferente porque a entrada depende de concurso público, já são quase 50%. A baixa representatividade está nos cargos de chefia, mas a tendência é de mudança. Para o Legislativo, as mulheres não recebem apoio nem mesmo do partido pelo qual concorrem, revelou.

Grupo de Trabalho

O diretor da Secretaria de Recursos Humanos do Senado, Rodrigo Brum, anunciou durante a reunião que a Casa está criando um grupo de trabalho para analisar e propor formas de tratamento institucional para eventuais denúncias de assédio moral e sexual que possam ocorrer no Senado. Também foi distribuído um folder sobre assédio sexual, com informações sobre o que o caracteriza, como prevenir e o que fazer em casos de constrangimento. Rodrigo também informou que os debates sobre assédio sexual não vão se restringir à palestra desta quinta-feira.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)