Meire Poza aponta envolvimento de Youssef com políticos e admite ter emitido notas frias

Da Redação | 08/10/2014, 16h59

Em quatro horas e meia de depoimento à CPI Mista da Petrobras, Meire Bonfim Poza, ex-contadora do doleiro Alberto Youssef, admitiu aos parlamentares, nesta quarta-feira (8), ter emitido R$ 7 milhões em notas frias em serviços prestados a empresas de seu ex-cliente. Além disso, ela confirmou o envolvimento do doleiro com vários políticos e com o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, disse que não está bem financeiramente e admitiu ter consciência de que cometeu ilegalidades e deve responder por elas.

 Nunca fugi da minha responsabilidade. A minha conta tenho dignidade para pagar; mas a conta dos outros eu não pago - afirmou.

Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef são apontados pela Polícia Federal como articuladores de um grande esquema de corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas e desvio de dinheiro público. Enquanto Meire falava à comissão de inquérito, o ex-dirtor da Petrobras Paulo Roberto deixava sua residência no Rio, onde cumpre prisão domiciliar, para prestar depoimento à Justiça Federal no Paraná.

Petrobras

Meire abriu sua participação na CPI avisando aos parlamentares que não dispõe de informações relativas à Petrobras e que poderia falar apenas sobre as operações feitas no escritório de Youssef.

Entretanto, ela confirmou que Paulo Roberto Costa fazia reuniões com o doleiro na sede da GFD Investimentos – empresa de fachada por meio da qual, segundo a PF, Youssef direcionava o pagamento de propinas a políticos e fazia remessas de valores para o exterior.

Ela informou nunca ter prestado serviço a qualquer empresa ligada à Petrobras, tampouco à Costa Global Consultoria, empresa de Paulo Roberto, e confirmou que o executivo recebeu de Youssef um Land Rover. Meire Poza  também disse desconhecer participação de Youssef na compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, negócio que deu prejuízo à Petrobras e também é alvo de investigação da CPI.

Notas frias

A testemunha informou que começou a prestar serviços para as empresas de Youssef em 2011. Ela recebia R$ 15 mil por mês para atender as holdings GFD e Graça Aranha e a Malga Engenharia. Meire disse que interrompeu suas atividades em março deste ano, quando foi deflagrada a operação Lava Jato pela Polícia Federal (PF).

Ela negou ter recebido  mais de R$ 1 milhão a título de honorários das empresas do doleiro, mas admitiu ter emitido notas fiscais frias que somam cerca de R$ 7 milhões. Ressaltou, no entanto, que foi uma “exceção” em sua atividade profissional, pois, segundo ela, mantinha atividade regular com outros clientes.

Mensalão

A contadora afirmou que o PT repassou dinheiro para Enivaldo Quadrado pagar a multa imposta pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no processo do Mensalão. Dono de uma corretora, Enivaldo foi condenado por lavagem de dinheiro na Ação Penal 470. Meire disse ter ido três vezes à casa do jornalista Breno Altman para pegar R$ 15 mil mensais para repassar a Quadrado a fim de que ele pagasse a penalidade.

Ainda em relação a Enivaldo Quadrado, a contadora disse ter guardado, a seu pedido, um contrato que, segundo a imprensa, seria depois usado para chantagear integrantes do PT.  O contrato  - apreendido pela Polícia Federal em seu escritório - é referente a um empréstimo de R$ 6 milhões entre a 2 S Participações LTDA, empresa de Marcos Valério, e a Expresso Nova Santo André, do empresário do setor de transportes Ronan Maria Pinto. A contadora disse desconhecer qual seria a utilização do contrato por Enivaldo Quadrado.

 Eu não tenho conhecimento de que tenha havido nenhum tipo de chantagem. Quando ele me pediu para que eu guardasse esse contrato, em momento algum ele falou para que ele tinha utilizado ou para que ele tinha utilizado. Eu só soube do teor depois da publicação da revista Veja - explicou.

Ministro

Meire Poza disse que o doleiro também mantinha contato com o ex-ministro das Cidades do governo Dilma Rousseff, Mário Negromonte, que lhe indicou a compra de uma empresa de monitoramento de veículos em Goiânia.

 Vim a saber, dentro da GFD, que a Controle Monitoramento de Veículos tinha sido indicada porque haveria uma aprovação do Denatran para que os carros já saíssem de fábrica com dispositivo para monitoramento. Só existiam cinco empresas homologadas para prestar esses serviços junto ao Denatran. E a Controle era uma dessas empresas homologadas - explicou.

Fundos de pensão

Ao ser indagada sobre o envolvimento de Youssef com fundos de pensão, a contadora afirmou que o doleiro lhe disse ter mantido encontro com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para acertar investimentos do Postalis (dos funcionários dos Correios), em uma empresa de Youssef.

Segundo Meire Poza, Youssef buscava apoio do senador para que os fundos de pensão dos Correios e da Caixa Econômica Federal (Postalis e Funcef)  investissem R$ 50 milhões em uma de suas empresas, a Marsans Brasil. Ainda de acordo com a contadora, o encontro ocorreu no dia 12 de março, pouco antes da prisão do doleiro pela operação Lava Jato, segundo lhe teria confidenciado o próprioYoussef . Antes disso, Alberto Youssef já "teria acertado R$ 25 milhões da ponta do PT” para saldar dívidas de sua empresa.

 A pessoa do Postalis [fundo de pensão dos Correios] nomeada pelo PT já havia resolvido e faltava a ponta do PMDB - disse a contadora.

Em nota, o senador disse não conhecer "a pessoa mencionada no noticiário como doleiro Alberto Youssef" e que só soube da existência dele após as informações publicadas pelos jornais. Ele reafirmou ainda que "nunca esteve, agendou conversas e nunca ouviu falar de Alberto Youssef e de sua contadora".

Luis Argôlo e André Vargas

A exemplo do que havia dito ao Conselho de Ética da Câmara em agosto, Meire Poza confirmou que o Alberto Youssef era amigo do deputado Luiz Argôlo (SD-BA), a quem deu de presente um helicóptero avaliado em cerca de R$ 800 mil. O veículo não chegou ser a transferido para o nome do parlamentar. Ela também afirmou ter feito pagamentos a parentes de Argôlo a mando de Youssef.

 O helicóptero foi adquirido de uma empresa chamada Cardiomédica. Ele foi adquirido e está registrado no balanço da GFD. Existem os documentos de compra, só que não foi feita a transferência - explicou.

Ela também mencionou o deputado André Vargas (sem partido-PR), que renunciou à vice-presidência da Câmara e se desfiliou do PT após o aparecimento de seu nome na operação Lava-Jato.

 Fiz pagamento para o deputado André Vargas, que depois eu soube que era do jatinho [emprestado pelo Youssef para uma viagem ao Nordeste], para familiares do Luiz Argôlo e outros pagamentos que eu não sei quem são as pessoas -  disse.

A lista com os nomes de pessoas a quem Meire Poza transferiu dinheiro a pedido de Youssef foi apreendida pela Polícia Federal durante a operação Lava Jato.  André Vargas e Luiz Argôlo respondem a processos no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.

Requerimentos

Antes de a testemunha se pronunciar, o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) chegou a propor que a reunião fosse fechada à imprensa e ao público para que a contadora ficasse mais à vontade para contar o que sabe, mas a maioria defendeu que o depoimento fosse aberto.

Alguns deputados insistiram também na votação de novos requerimentos, o que não foi possível por conta da falta de quórum.  Entre os pedidos, estão a quebra de sigilos bancário e fiscal de Meire Poza. O pedido partiu do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), pois a contadora não é testemunha, mas integrante do esquema de corrupção.

Por enquanto, a CPI Mista não tem data para voltar a se reunir. Nesta quarta-feira (7), o presidente Vital do Rêgo (PMDB-PB) participou da reunião, que foi presidida pelo senador Gim (PTB-DF).

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)