Projetos buscam ampliar clientela do mercado de 'energia livre'

Augusto Castro | 29/09/2014, 15h56

Desde 2007, todas as residências, indústrias e pequenas, médias e grandes empresas dos países da União Europeia podem escolher livremente de qual fornecedora comprar energia elétrica. Essa prática foi chamada de ‘portabilidade da conta de luz’ ou, ainda, ‘energia livre’. No Brasil, a partir de 1995, criaram-se os chamados ‘consumidores livres’, que têm o direito de escolher o fornecedor de energia e negociar o preço diretamente com eles.

Mas, por enquanto, esse direito só pode ser exercido por grandes consumidores no Brasil. De acordo com a legislação atual, os “consumidores livres convencionais” devem ter capacidade instalada maior que 3 megawatts (MW). Existem também os “consumidores livres especiais”, que são aqueles individuais ou em grupo, que compartilham o mesmo interesse, com capacidade instalada acima de 500 quilowatts (kW), alguns shopping centers, por exemplo.

Para se ter uma ideia, 1 MW equivale a mil quilowatts e um quilowatt é igual a mil watts. Uma conta de luz de 500 kW custa mensalmente mais de R$ 50 mil.

Segundo o presidente executivo da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel), Reginaldo Medeiros, o mercado livre de energia já é responsável pela comercialização de 27% de toda a energia do Brasil. Nos cálculos da entidade, desde a criação do chamado Ambiente de Comercialização Livre (ACL) em 1995, as mais de 1.500 indústrias e grandes empresas que já aderiram à portabilidade economizaram em torno de R$ 50 bilhões em suas contas de luz, pois a energia elétrica no mercado livre é entre 10% e 15% mais barata que no mercado convencional.

Três projetos de lei de autoria do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), apresentados este ano, têm por objetivo ampliar o número de consumidores que possam aderir a esse mercado livre.

Grandes consumidores

O PLS 237/2014 altera a Lei 9.074/1995 para permitir que todo consumidor do chamado Grupo A (grandes consumidores) cuja carga seja igual ou maior a 3 MW possa escolher “o fornecedor com quem contratará sua compra de energia elétrica”. Atualmente, nem todos os consumidores desse tamanho podem aderir, pois a legislação diferencia as empresas e indústrias criadas antes ou depois da edição da lei e também estabelece critérios relativos ao nível de alta tensão usado.

E o projeto vai além: estabelece que o critério dos 3.000 kW seja diminuído para 2.000 kW um ano após a aprovação da lei e para 1.000 kW após dois anos. O PLS 237/2014 tramita em caráter terminativo na Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI), onde aguarda designação do relator.

Na justificação da matéria, Delcídio argumenta que, com a mudança, “estima-se que cerca de 6.500 consumidores serão beneficiados, ampliando o ACL”. Ele afirma que, dos 27% atuais, o consumo nacional dentro do ACL poderia chegar a 41%.

“Nos Estados Unidos e Canadá, 65% e 50% do mercado são elegíveis, respectivamente. Na Austrália e Nova Zelândia a totalidade do mercado é elegível. Aqui, na América do Sul, os limites de elegibilidade para o Mercado Livre são: 30 kW na Argentina; 100 kW na Colômbia, Guatemala e Panamá; 250 kW no Uruguai; 1 MW no Peru e Bolívia; e 2 MW no Chile”, afirma Delcídio.

Além disso, de acordo com a Abraceel, se essa liberdade for ampliada no Brasil, as energias alternativas como a eólica, solar e de biomassa passarão por grande crescimento. Para essa entidade, só assim o país começaria a trilhar o mesmo caminho europeu, ou seja, dar essa liberdade a todo e qualquer consumidor.

Consumidores livres

O PLS 238/2014 vai no mesmo caminho e objetiva ampliar o seguimento dos consumidores livres especiais, diminuindo de 500 kW para 200 kW o nível mínimo de consumo para adesão à portabilidade. De acordo com Delcídio, com essa alteração, o mercado de consumidores especiais no país passaria de 3% do consumo para 6%. O projeto tramita na Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA), onde é relatado pelo presidente do colegiado, senador Blairo Maggi (PR-MT), e depois seguirá para decisão terminativa na CI.

“O mercado livre, com sua capacidade de reconhecer a individualidade de cada consumidor em lidar com os riscos e oportunidades da comercialização de energia, promove a inovação e o equilíbrio entre oferta e demanda com decisões descentralizadas sobre o consumo e a produção de energia”, defende Delcídio.

Isonomia

Já o PLS 239/2014 busca dar isonomia para os grandes consumidores de energia que existiam antes da edição da lei de 1995 e aqueles que surgiram depois. Segundo a Lei 9.074, consumidores de grandes cargas elétricas (iguais ou superiores a 10.000 kW) que já existiam antes de 1995 são obrigados a contratar todo o seu fornecimento energético com a empresa distribuidora tradicional, a não ser que transitem em níveis de tensão de 69 quilovolts ou superior.

O projeto de Delcídio extingue essa exigência de nível de tensão e ainda estipula que o consumo mínimo exigido passará de 10.000 kW para 3.000 kW decorridos 5 anos da publicação da lei.

Para o senador, a modificação é uma questão de isonomia: “Os consumidores que se conectaram ao sistema elétrico antes de julho de 1995 só podem exercer essa opção se estiverem conectados em tensão maior ou igual a 69 KV. Os que se conectaram após essa data não têm restrição. Esse tratamento assimétrico entre agentes semelhantes precisa ser corrigido”, destaca.

O PLS 239 também está na CMA, sob a relatoria de Blairo Maggi. Em seguida, será enviado para decisão terminativa na CI.

Ainda segundo a Abraceel, existem hoje no Brasil mais de 750 empresas vendedoras de energia, a maior parte delas usam fontes limpas como energia eólica, solar, pequenas centrais hidrelétricas e biomassa. A entidade calcula em mais de 10 mil o número de indústrias no país aptas a aderir ao mercado livre, pois consomem a partir de 500 kW.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)