Falta de quórum impede votação de urgência para projeto que cria restrições a novos partidos

Paola Lima e Nelson Oliveira | 24/04/2013, 22h00

A votação do pedido de urgência ao Projeto de Lei da Câmara 14/2013, que impede deputados de levarem tempo de rádio e TV, e fundo partidário, para nova legenda, foi adiada por falta de quórum. Sem acordo para votação simbólica, e sem número regimental (41 senadores) para sustentar a votação nominal, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), foi obrigado a encerrar a sessão.

O requerimento, que havia sido apresentado pelo senador Gim Argello (PTB-DF), ficou prejudicado. Para que a urgência volte a ser apreciada, será preciso novo pedido, com a assinatura de líderes partidários correspondentes a 2/3 do Senado.

O exame do requerimento ocorreu em clima tenso. Quando, depois de todos os inscritos se manifestarem, o pedido foi colocado em votação, os parlamentares contrários ao requerimento chegaram a dá-lo como rejeitado. Eles usaram a expressão "rejeitado por contraste", já que visualmente lhes parecia clara a superioridades dos votos 'não' e, ao mesmo tempo, a falta de quorum.

Renan então procedeu a uma chamada dos líderes partidários, como é usual nas votações em que os integrantes de cada partido seguem orientação única dirigida à bancada. Trata-se nesses casos de votação simbólica, que não costuma sofrer contestação quando é evidente o quorum. O procedimento, entretanto, foi questionado, pois já àquela altura havia pedidos de verificação do número de presentes. Ainda assim, a consulta aos líderes continuou, incluindo os dos partidos contrários ao requerimento. Argumentando que se tratava de procedimento regimental, e que em seguida faria a contagem do quorum, o presidente do Senado anunciou 47 votos a favor do pedido de urgência. "Maioria absoluta, está, portanto, aprovado o requerimento, mas vamos proceder à verificação".

O passo seguinte adotado por líderes do PSB, PSDB, PSOL e PSC foi se declararem em obstrução, o que retirou obrigatoriamente os senadores desses partidos da contagem que se iniciava. Junto com o PDT e o PRB, os quatro partidos haviam se colocado contra a urgência no momento da consulta aos líderes. Votaram sim os líderes do PT, PMDB, DEM, PR e PTB. Ao final da verificação de quorum, foram registrados apenas 23 votantes, o que levou ao encerramento da sessão, à qual poderiam ter comparecido 76 senadores, conforme o registro dos presentes na Casa.

Alvos

Assim como ocorreu na votação na Câmara dos Deputados, parte dos senadores classificou a apresentação do projeto como um “casuísmo” do governo, uma tentativa de reduzir o acesso de novos partidos ao tempo de propaganda eleitoral na rádio e na televisão. O alvo principal seria a Rede Sustentabilidade, legenda que está sendo criada pela ex-ministra Marina Silva, possível candidata à Presidência da República em 2014. O outro seria uma eventual candidatura do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB).

Par os defensores da mudança, a proposta fortalece o princípio da fidelidade partidária, evitando a criação de partidos de aluguel, sem ideologia partidária ou intenção de crescer na política brasileira.

Contrária ao requerimento de urgência e à aprovação da proposta, a bancada do PSB, foi uma das que mais duramente criticou medida. Autor de um mandado de segurança encaminhado ao  Supremo Tribunal Federal (STF) para sustar a tramitação da matéria, o líder do PSB, senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF),  explicou que o propósito da ação na Justiça foi “evitar o constrangimento de fazer com que a Casa fosse obrigada a deliberar sobre um projeto claramente inconstitucional”.

- Quero alertar para o fato de que as mudanças de regra do jogo político fazem com que o Brasil perca a credibilidade, porque aqueles que querem investir no Brasil, que imaginam o Brasil como um país seguro, estão também prestando atenção se aqui há estabilidade nas regras democráticas, se aqui as regras que valem para um valem para todos, se não vai haver mudanças na regra do jogo durante o andamento – afirmou.

'Abuso legislativo'

O líder do PSDB, senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), também considerou a medida um “casuísmo”. Ele acusou o projeto de ser meramente uma tentativa de impedir a candidatura da ex-senadora Marina Silva, que acompanhava a votação no Plenário. O senador questionou porque proposta semelhante não foi discutida ou apoiada pelo governo em 2011, época da criação do PSD, partido que hoje integra a base de governo.

Aloysio advertiu ainda para o risco de não se analisar o projeto na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), uma vez que, aprovado o regime de urgência, a matéria seria analisada unicamente pelo Plenário, sem tramitar nas comissões permanentes da Casa.

- Agora se pretende subtrair ao exame da Comissão de Constituição e Justiça uma proposição que recebeu contestação quanto aos seus fundamentos constitucionais. Refiro-me ao Senador Rollemberg que recorreu, inclusive, ao Supremo Tribunal Federal, denunciando o que ele chama de abuso legislativo. Abuso legislativo é um nome civilizado para o velho e conhecido casuísmo - declarou.

Casuísmo também foi o termo usado pela senadora Ana Amélia (PP-RS) para classificar o PLC.  A senadora, assim como a colega Lídice da Mata (PSB-BA), ponderou que, se a preocupação é com o fortalecimento dos partidos e do processo eleitoral brasileiro, o Congresso deveria discutir e votar a reforma política como um todo. Em sua avaliação, a aprovação da urgência para a matéria foi um “apressamento injustificável de uma matéria que deveria estar incluída no conjunto da reforma política”.

Fidelidade partidária

Em defesa do PLC 14/13, o líder do PT, senador Wellington Dias (PT-PI), argumentou que o projeto não proíbe a criação de novos partido, apenas fortalece o respeito aos partidos existentes.

O senador lembrou que a proposta foi apresentada em setembro do ano passado, no auge dos escândalos de negociatas envolvendo a criação de novas legendas. A fundamentação da proposta foi de que, se um mandato pertence ao partido – no caso de um parlamentar decidir trocar de legenda em meio ao mandato – também cabem a esse partido os benefícios decorrentes daquele mandato, como os recursos do Fundo Partidário ou o tempo de propaganda eleitoral.

- O contrário disso seria aprovar aqui um incentivo à infidelidade partidária. Ouso dizer em nome do povo: nós vamos ter uma esculhambação partidária. Por que será que, de uma hora para outra, aparecem, na Justiça Eleitoral, 39 pedidos de criação de partido, criação de 39 partidos? Por que será isso? Por que a gente levou tantos anos para chegar num número que temos hoje e, de repente, essa febre de criação de partidos? Há uma anomalia. Não acredito que se tenham 80 ideologias, 80 diferentes projetos para este país. O que nós temos aqui é uma negociata, e é contra isso que o meu partido orienta votar – argumentou.

Validade para 2016

O senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) foi menos duro com o projeto de lei. O senador disse ser favorável ao mérito da proposta, mas não à forma como ela está sendo aprovada ou à urgência do projeto, que considerou “intempestiva”. Sua sugestão foi de que a proposta seja votada e aprovada no Senado, mas não tenha aplicação nas eleições de 2014, mas apenas no pleito seguinte.

Para senadores como Pedro Simon (PMDB-RS) e Aécio Neves (PSDB-MG), o PLC 14/2013 "fere a democracia" ao impedir que novas agremiações tenham o mínimo de condições para se apresentar aos eleitores. Simon cobrou do PT, que fechou questão em torno do assunto, uma atitude mais elevada, até em memória de um passado em que sofreu impedimentos para se organizar.

- O Senado vai votar o pacote de abril da Dilma e impedir criação democrática do partido da Marina - disse Simon, em referência ao pacote de medidas baixadas em 13 de abril de 1977 pelo presidente Ernesto Geisel para forçar a eleição de candidatos governistas. Vem desse episódio a denominação 'senadores biônicos', dada à parcela (1/3) dos parlamentares eleitos indiretamente no pleito seguinte.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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