Oscar Niemeyer condenou tombamento de Brasília e pobreza das cidades satélites

helena-dalto-pontual | 05/12/2012, 23h15

Oscar Niemeyer projetou os palácios de Brasília, mas sua paixão sempre foi o Rio de Janeiro, sua cidade natal. Em várias entrevistas à imprensa, o arquiteto declarou que não viveria em outro lugar, principalmente porque não conseguiria estar longe do mar. Nos últimos anos, manifestou sua decepção com os rumos tomados por Brasília que, como tantas outras cidades, tem problemas sociais – com segregação de moradores do Plano Piloto e das cidades satélites –, e também criticou o tombamento da capital federal.

Foi em Brasília, no entanto, que Niemeyer surpreendeu o mundo com seus projetos ousados, traçados com leveza e harmonia, impondo aos engenheiros que construíram os prédios e palácios da capital federal um grande desafio: fazer do concreto armado uma obra de arte.

"É sabido que Oscar Niemeyer odeia o capitalismo e odeia o ângulo reto. Contra o ângulo reto, que ofende o espaço, ele fez uma arquitetura leve como as nuvens, livre, sensual, que é muito parecida com as paisagens das montanhas do Rio de Janeiro, montanhas que parecem corpos de mulheres deitadas, desenhadas por Deus no dia em que Deus achou que era Niemeyer". O comentário foi feito por um grande amigo de Niemeyer, o jornalista e escritor uruguaio Eduardo Galeano, em documentário sobre a vida e a obra do arquiteto, de Fabiano Maciel.

Nesse mesmo documentário, Niemeyer revelou o segredo de sua longevidade: "as mulheres". As mesmas mulheres que o levaram a revolucionar a arquitetura com um protesto contra os ângulos retos e a esgotar todas as possibilidades do concreto armado.

Em entrevistas à imprensa, Niemeyer chegou a dizer que estava decepcionado com o rumo que Brasília havia tomado, mantendo, como tantas outras cidades brasileiras, uma grande segregação social. Mas, ao projetar os palácios da cidade, o arquiteto já tinha em mente que aquelas obras não seriam desfrutadas pelos mais pobres, o que pode ser constatado em sua declaração no documentário de Maciel: “Quando me encomendam um edifício público, tento fazê-lo lindo, diferente, que gere surpresa. Porque sei que os mais pobres não vão desfrutar nada, mas podem parar para vê-lo e ter um momento de prazer, de surpresa. É essa a forma como a arquitetura pode ser útil".

No início de 2009, Niemeyer envolveu-se numa polêmica com a cidade: apresentou um projeto de construção da Praça da Soberania, que seria construída nos jardins entre a Rodoviária do Plano Piloto e o Congresso Nacional. Criticado por arquitetos, representantes do governo e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o projeto de Niemeyer, desta vez, não saiu do papel, rejeitado que foi pelo GDF e até mesmo pela população da cidade, ouvida em enquetes realizadas por jornais.

Durante essa polêmica, Niemeyer não só defendeu a construção da tal praça como afirmou que o tombamento de Brasília “era uma besteira”. Argumentou que todas as principais cidades do mundo sofrem modificações ao longo do tempo.

Em entrevista concedida em fevereiro de 2009 ao jornal Folha de São Paulo, o arquiteto disse: “Uma cidade não pode ser tombada, porque sempre aparecem modificações. Se Paris fosse tombada não existiria a Champs-Élysées nem o Arco do Triunfo. Se Barcelona fosse tombada a cidade não teria se voltado naturalmente para o mar. Uma cidade tombada é uma ignorância. As modificações são inevitáveis, e Brasília ainda vai passar por muitas delas”.

Para Niemeyer, Brasília está um tanto modesta para um país que cresce “com tanto entusiasmo”. Disse mais: “Se o Juscelino [o então presidente Juscelino Kubitschek, responsável pela construção de Brasília] estivesse vivo, ele ia ficar do meu lado. Ele nunca aceitaria o que está se passando nas cidades satélites”.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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