Especialistas defendem lei específica para proteção do Cerrado

Iara Guimarães Altafin | 10/04/2012, 14h19

Especialistas convidados para debate na Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA) defenderam, nesta terça-feira (10), a criação de uma legislação específica para assegurar a utilização racional do cerrado brasileiro. Conforme enfatizaram, é preciso proteger solos e recursos hídricos para garantir o avanço da agropecuária, mas também definir normas para proteção das áreas ainda cobertas por vegetação nativa.

Segundo maior bioma brasileiro, atrás apenas da Amazônia, o cerrado compreende cerca de dois milhões de km² e está presente em dez estados e no Distrito Federal. Estima-se que metade da área original já tenha sido modificada pela ação humana, processo ocorrido principalmente nos últimos 50 anos.

– É um espaço de tempo muito curto. Se continuar nesse ritmo, em 40 anos teremos apenas remanescentes de cerrado, como ocorreu com a mata atlântica [7% da área original] – alertou o superintendente da Fundação Pró-Natureza (Funatura), César do Espírito Santo.

O bioma reúne cerca de 10.000 espécies de plantas, 837 espécies de aves, 820 espécies de abelhas silvestres e 47% da fauna brasileira, informou Roberto Cavalcanti, secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente.

Atualmente, apenas 2,6% dessa riqueza estão protegidos em unidades de conservação federal, de acordo com Donizete Tokarski, presidente do Conselho da Agência Brasileira de Meio Ambiente e Tecnologia da Informação (Ecodata).

– O cerrado de fato está abandonado do ponto de vista de unidades de conservação integral – observou.

Produtividade

Da área de cerrado aberta, mais de três quartos são pastagens, voltadas á criação de 72 milhões de cabeças de gado – a região responde por 40% da produção de carne bovina do país. O restante está ocupado principalmente por grãos, sendo que a região responde por 84% do algodão produzido no país, 60% da soja e 44% do milho.

Os avanços da produção agrícola, conforme destacou José Roberto Peres, chefe da Embrapa Cerrados, resultaram de ganhos de produtividade agrícola, a partir da incorporação de tecnologia que permitiu ao país produzir mais na mesma área.

Ele alertou, no entanto, para o passivo social e ambiental resultante do crescimento da agropecuária: êxodo rural, o uso exaustivo de recursos naturais e de insumos derivados do petróleo, além de poluição e contaminação dos rios.

Conforme observou, o país dispõe de tecnologia para uma produção mais sustentável, reduzindo o desmatamento e potencializando o uso de áreas já abertas.

– Temos a grande oportunidade de inserirmos o modelo de economia verde, que retorna para a sociedade investimentos em redução nas emissões, uso de eficiente de recursos naturais e redução de resíduos – opinou.

Ao destacar a importância da Embrapa, o senador Blairo Maggi (PR-MT) frisou que “sem pesquisa, o Brasil ainda seria um importador e não um exportador”.

– Sem a produção agrícola no cerrado, o Brasil não seria o que é hoje e estaria em maior dependência econômica e social – disse, ao criticar aqueles que antagonizam produção e preservação.

No entanto, Donizete Tokarski observa que o aproveitamento sustentável do cerrado esbarra na falta de assistência técnica capaz de valorizar a diversidade do bioma.

– É preciso rever a formação profissional, para que o técnico não veja apenas a produtividade das culturas, mas que também reconheça a potencialidade da biodiversidade do cerrado.

Água

Os especialistas também manifestaram preocupação com as consequências da destruição do cerrado sobre os recursos hídricos. Estão presentes na região os aquíferos Guarani e Urucuia, além da cabeceira de importantes bacias hidrográficas, como São Francisco, Paraná e Araguaia-Tocantins.

Para Mercedes Bustamante, professora da Universidade de Brasília (UnB), a retirada da vegetação interfere diretamente no papel de “caixa d’água” do bioma.

– Quando modificamos a cobertura vegetal, estamos mexendo na transferência desse importante recurso que é a água – frisou.

Para o senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), é preciso aprofundar o conhecimento sobre o ciclo hidrológico e os mecanismos de reabastecimento de mananciais subterrâneos e superficiais. Ele também destacou a necessidade de gerar informações sobre os serviços ecossistêmicos das áreas preservadas.

Nova legislação

No debate, foi defendida a aprovação da chamada PEC do Cerrado (PEC 115/1995), que altera o artigo 225 da Constituição Federal para incluir o bioma como patrimônio nacional, ao lado da floresta amazônica, mata atlântica, pantanal e zona costeira, já previstos na Carta. A matéria tramita na Câmara dos Deputados.

Os especialistas também sugeriram aspectos que devem ser considerados quando da definição de políticas e legislação para uso do cerrado. Além de questões como a proteção da biodiversidade, observaram a necessidade de caracterização das diversas formas de apresentação da vegetação.

Destacaram ainda a necessidade de proteção da população local e de adoção de políticas que incentivem a diversificação das atividades econômicas, valorizando frutos e produtos do cerrado, além dos serviços ambientais prestados pelo bioma.

Para o senador Jorge Viana (PT-AC), é preciso uma legislação que atenda “à agenda do Brasil: agenda da água, da conservação e preservação dos recursos naturais e a agenda da produção de alimentos”. No mesmo sentido, o senador Sérgio Souza (PMDB-PR) apoiou a criação de leis específicas para o bioma, “com a responsabilidade da sustentabilidade”.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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