Médicos e governo discordam sobre mudanças na Lei de Drogas

Da Redação | 15/09/2011, 15h59

Representantes do governo e médicos especialistas em dependência química manifestaram posições contrárias em relação ao projeto de lei do senador Demóstenes Torres (DEM-GO), que prevê pena de detenção ou tratamento especializado em condutas relacionadas a drogas.

O projeto de lei (PLS 111/2010) foi discutido em audiência pública na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), nesta quinta-feira (15), a requerimento da relatora da matéria na comissão, senadora Ana Amélia (PP-RS).

A Lei de Drogas (Lei 11.343/06) não precisa ser modificada, afirmou o representante da Secretária Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), do Ministério da Justiça, Vladimir Stempliuk. Em sua opinião a legislação é coerente com a política de humanização do atendimento a dependentes químicos, bem como com a Constituição, pois respeita os direitos humanos e as liberdades individuais.

Ele disse que a Senad não concorda com punição e internação compulsória por considerar a dependência de drogas doença e não problema de segurança pública. Ele argumentou que o Estado não pode obrigar as pessoas a buscarem tratamento ou modificar a dieta para evitar doenças. Assim, ressaltou, a lei vigente prioriza o combate aos grandes grupos criminosos e não a prisão dos usuários.

Demóstenes Torres (DEM-GO) explicou que a proposta não tem a finalidade de levar usuários à prisão, mas de dar ao juiz possibilidade de aplicar uma pena, uma vez que a lei atual apresenta apenas meras recomendações. Na avaliação do senador, a lei atual é inconstitucional, uma vez que criminaliza condutas associadas a drogas, mas não prevê punição.

O senador ressaltou que as drogas estão diretamente relacionadas ao crime. Assim, observou, a internação e tratamento, mesmo contra a vontade do usuário, são necessários para preservar a saúde e a segurança coletivas.

Demóstenes disse ainda estar preocupado que o governo esteja "espalhando mentiras", difundindo a idéia equivocada de que a proposta vai prender em massa os usuários de drogas.

- Não se pode falsear, mentir sobre o projeto. Não devemos convencer pela mentira - disse Demóstenes Torres.

Também a representante da Área de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Maria Cristina Correa Hoffmann, disse que o ministério é contrário à proposta - que considera "um retrocesso" - por abordar tratamento como sinônimo de pena. Para ela, o Estado deve garantir o direito à vida e à saúde ao estimular mudanças no comportamento dos cidadãos e não puni-los. A lei, afirmou, já prevê punição em casos em que houver infração penal.

Maria Hoffmann informou que o governo elabora programa de estratégias para enfrentamento das drogas, com diversos ministérios. Ela disse que as pessoas têm liberdade de escolher sobre sua qualidade de vida e garantiu que a lei em vigor prevê assistência gratuita de saúde.

Avanço

O presidente do Conselho Regional de Medicina de Goiás, Salomão Rodrigues Filho, disse que a proposta de Demóstenes é "um avanço", pois apresenta alternativa para reduzir problemas gerados pelo consumo de drogas. A maioria dos crimes que vão a júri popular - os dolosos contra a vida - está relacionada ao uso de drogas, informou. Em Goiânia (GO), disse, 61% dos crimes julgados pelo Tribunal do Júri têm ligação com drogas.

Salomão Rodrigues sugeriu adoção de pena financeira, proporcional ao patrimônio do usuário. Segundo ele, são os usuários recreativos - consumidores eventuais e que não são dependentes - que sustentam o trafico de drogas.

Ele afirmou que o poder público não oferece assistência adequada aos dependentes de drogas, tanto lícitas como ilícitas, o que gera a degradação da sociedade. Para ele, a política de tratamento das doenças mentais adotada pelo Brasil transferiu esses doentes para as penitenciárias. Ele informou que cerca de 60% dos presidiários são pessoas com problemas mentais.

A reforma psiquiátrica - que desativou manicômios e proibiu que hospitais contratassem novos leitos para tratar doenças mentais - é equivocada, também na opinião de Marcelo Ferreira Caixeta, médico psiquiatra especialista em dependência química. Ele disse que existem casos em que é preciso internação para evitar que pessoas sem condições causem danos a si ou a pessoas próximas. Os hospitais gerais, disse, não têm estrutura para atender esses doentes.

Essa falta de estrutura para atender os dependentes químicos e os doentes mentais, observou, não depende de recursos, mas de melhor gerenciamento.

- A proposta de Demóstenes é uma esperança para políticas de saúde e segurança, que já se demonstraram catastróficas, disse Marcelo Caixeta.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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