Liberdade condicional pode ser dificultada para autor de crime hediondo

Da Redação | 16/07/2010, 18h03

Na primeira reunião de votações depois do recesso parlamentar, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) terá mais uma oportunidade de votar o projeto PLS 249/05, que trata do livramento condicional. A matéria é a primeira na pauta da comissão para o dia 4 de agosto, e está cercada de especial interesse. É que tem relação com um assunto para o qual o país todo se volta no momento: o sequestro e a morte, em circunstâncias brutais, da modelo Eliza Samudio.

O autor do projeto, senador Hélio Costa (PMDB-MG), propõe a ampliação do tempo de pena a ser cumprido antes que um condenado por crime hediondo possa requerer o livramento condicional. Como se sabe, o beneficiado por esse mecanismo ganha a liberdade com a condição de comparecer periodicamente à Justiça para comprovar sua permanência na comarca onde reside e justificar suas atividades.

A proposta aumenta, de dois terços para quatro quintos, o tempo mínimo de permanência do preso, em regime fechado, como um dos pré-requisitos para o livramento condicional. Para tanto, prevê a alteração do artigo 83 do Código Penal (CP). Além dos crimes hediondos, a regra dos dois terços vale para as condenações por prática de tortura; tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins; e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.

Favorável ao projeto, o presidente da CCJ e relator do PLS 249/05, senador Demostenes Torres (DEM-GO), disse estar empenhado na aprovação da matéria na reunião marcada para o dia 4, que coincide com o esforço concentrado de votações do Plenário. Ele espera que o exame do projeto, já há alguma semanas na pauta, seja viabilizado pela presença de no mínimo 12 senadores, já que a matéria é terminativa, ou seja, se aprovada pode seguir diretamente para a Câmara dos Deputados.

O parlamentar goiano refuta as objeções de integrantes do Ministério da Justiça à votação de matérias quando há um clamor popular em relação a crimes como o que vitimou Eliza Samudio. Essas autoridades entendem que um clima emocional muito forte pode distorcer o juízo dos legisladores, levando-os a aprovar penas mais severas do que o necessário.

- Vivemos no Brasil um clamor permanente, já que ocorrem 50 mil homicídios por ano. O que precisamos é dar tranquilidade ao país - observou Demostenes, que é procurador de Justiça licenciado.

Em sua justificativa, o autor do projeto classifica como "inadmissível que um homicida, depois de executar a vítima com requintes de crueldade, possa ganhar a liberdade ao cumprir apenas dois terços da pena". Por isso, o projeto do parlamentar mineiro assegura o livramento condicional para os condenados por crimes hediondos, mas somente depois do cumprimento mínimo de quatro quintos da pena.

Por exemplo, se a pena for de 20 anos, o condenado terá de cumprir 16 anos, restando apenas os quatros anos finais para a liberdade condicional. Pelas regras atuais, ele poderia ter direito a abrandar a pena depois de cumprir 13 anos e três meses, restando-lhe, portanto, seis anos e seis meses fora da prisão.

Progressão de regime 

A discussão sobre a matéria tem provocado confusão por causa da sentença do Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito da lei 8.072/90, no que se refere à progressão de regime - de fechado, passando a semi-aberto e a aberto. Originalmente, a lei sancionada em 1990 previa o cumprimento da pena para crimes hediondos integralmente em regime fechado, embora permitisse o livramento condicional cumpridos os dois terços.

Em 2006, entretanto, o STF declarou a lei 8.072 inconstitucional, por impedir a progressão de regime. Os ministros da corte suprema entenderam que vedar a progressão feria o princípio jurídico da individualização da pena. Segundo o site Jus Brasil, esse princípio existe para que a sanção penal possa ser adaptada ao criminoso. Respeitados os limites estabelecidos em lei, o juiz deve aplicar a quantidade de tempo que, no caso concreto, atenda à finalidade da pena, ou seja, a recuperação social do condenado.

"Embora sejam mecanismos destinados a facilitar a regeneração dos criminosos, de fato, progressão de regime e livramento condicional são institutos autônomos, e possuem naturezas diversas", explica o jurista Luciano D'Abadia Guimarães.

O beneficiado pelo livramento condicional pode conduzir sua vida sem maior interferência da Justiça, com exceção do comparecimento periódico ao cartório judicial para comprovar residência e dar conta de suas atividades.

A progressão de regime permite, a princípio, a passagem do preso do regime fechado para o regime semi-aberto. Neste, o preso fica sujeito a trabalho em comum durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. O trabalho externo é admissível, bem como a freqüência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior, segundo explica o site Jus Brasil. De todo modo, o condenado ainda passa o período da noite no instituto penal.

De acordo com a mesma fonte, a reclusão em regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado. Este deverá, fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, freqüentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido em casa durante o período noturno e nos dias de folga.

- É muito importante não confundir o livramento condicional com a progressão de regime - apela Demostenes, que é a favor do endurecimento das normas também para a progressão.

O presidente da CCJ relembra que, com a decisão do STF, o Congresso aprovou a Lei 11.464/07, alterando a redação da Lei 8.072/90. Estabeleceu, portanto, a progressão após o cumprimento de dois quintos da pena, se o apenado for primário, e de três quintos, se reincidente. O que o senador do DEM defende é que o condenado em grau primário possa "progredir" de regime depois de cumprir dois terços da pena. No caso do reincidente, essa progressão só poderia se dar depois de cumpridos quatro quintos da sentença.

Segundo a lei 8.072, são considerados crimes hediondos o homicídio, quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente; o homicídio qualificado (praticado com crueldade, por exemplo); o latrocínio; a extorsão qualificada pela morte; a extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada; o estupro de [pessoa] vulnerável ; a provocação de epidemia com resultado morte; a falsificação, a corrupção, a adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais; e o genocídio.

Nelson Oliveira / Agência Senado

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

MAIS NOTÍCIAS SOBRE: